O senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) pediu que o Brasil e demais países da América do Sul “lutem pela paz” na Colômbia, como forma de elevar a auto-estima e ampliar a independência da região. Em pronunciamento nesta terça-feira (), o parlamentar fez uma análise da situação política dos países sul-americanos para mostrar que a Colômbia não acompanhou os avanços políticos alcançados pelas demais nações, como o Brasil, o Uruguai, o Equador, o Chile, a Bolívia e até a Argentina e o Peru.
– Todos deveriam considerar extraordinário o episódio da conquista do governo da Bolívia por uma nação massacrada durante anos e anos. Mesmo no Peru, as forças mais à direita foram derrotadas, o centro venceu. Na Venezuela, a vitória de Chávez, todas essas conquistas têm grande significado para a América do Sul – afirmou, acrescentando que os avanços retiraram do poder “forças políticas conservadoras” que “afundaram a América do Sul em crises sociais terríveis”.
Inácio Arruda afirmou que as forças do campo democrático e popular continuam subjugadas na Colômbia porque há alguns anos, quando anunciaram que iriam participar do processo eleitoral, todos os integrantes das guerrilhas que se candidataram foram assassinados.
– Foram massacrados pelos governantes e pelos paramilitares, assassinados friamente. Então o conflito, que dura mais de quatro décadas, se manteve – explicou.
De acordo com Inácio Arruda, “são assessores militares norte-americanos que conduzem a política na Colômbia”. Para ele, se o conflito naquele país for superado, “estará aberto o caminho para um período de prosperidade na América do Sul”.
Em aparte, o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) parabenizou o orador por enfocar a responsabilidade dos brasileiros em encontrar caminho de paz na Colômbia.
Inácio Arruda também criticou a construção de “uma pista colossal patrocinada com recursos americanos” na tríplice fronteira, entre Brasil, Paraguai e Argentina. Também exortou os parlamentares e dirigentes dos três países a iniciarem “uma campanha para a retirada de qualquer base na região”.
Segue íntegra do pronunciamento:
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB – CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) – Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu já tinha indicado para o Senador Arthur Virgílio que o assunto era o mesmo, embora o meu desejo era tratar aqui, no dia de hoje, da visita em conjunto que fizemos ao interior do Estado do Ceará, com o Presidente da República. Foi uma visita muito proveitosa, porque muitos programas sociais entraram em processo de execução; muitas obras importantes, impactantes para o Estado do Ceará; investimentos em recursos que nunca o Estado do Ceará viu: um volume de recursos para o Estado do Ceará, o Governo estadual, as Prefeituras municipais, independente de partido. Quer dizer, todos os partidos que tiveram projetos apresentados pelas suas administrações, partidos que estão dirigindo Municípios importantes, foram aproveitados no Governo de Lula e estão sendo executados, mostrando que não pode haver discriminação quando se pensa em desenvolver o Brasil.
Eu estava na Comissão Parlamentar de Inquérito louco para vir para cá porque o tema é muito instigante. A questão da geopolítica latino-americana é muito importante. Talvez alguns não tenham se dado conta ainda do que ocorre na América do Sul. Queremos fechar os olhos. Mas vamos examinar. Vivemos décadas sob uma tutela cruel: primeiro, da política de guerra fria, de intervenções ditatoriais, de derrubadas de governos. O próprio Brasil foi acusado de participar de ações para derrubar governos na América do Sul, principalmente organizadas pela Companhia de Inteligência Americana. Vivemos esse período inteiro de ditaduras, de investidas americanas na América do Sul, de tutela de governos, de constituição de governos fantoches na América do Sul. Há o que nós vemos ainda pelo mundo: o Oriente Médio está em chamas por essas razões.
Ocorre que, com os ventos políticos mais favoráveis, com uma maior democratização na América do Sul, com a desmoralização de muitos regimes fantoches, ascendeu aos governos na América do Sul um conjunto de forças mais avançadas, compostas por partidos do campo popular, democrático, da esquerda latino-americana.
Isso ocorreu no Chile, agora dirigido pela Presidente Michelle Bachelet; aconteceu no Uruguai, com Tabaré Vazquez; aconteceu o mesmo na Argentina, onde o partido é o mesmo, mas com muitas correntes, e aquelas mais à esquerda conseguiram conquistar a Presidência da República; aconteceu com o Equador, com Rafael Correa, e houve um episódio que todos deveriam considerar como extraordinário, excepcional, a conquista do governo da Bolívia por uma nação daquele povo que foi massacrado durante anos e anos: lá está Evo Morales, presidindo a nação boliviana. Mesmo no Peru, as forças mais à direita foram derrotadas; o centro venceu, não foi a esquerda, mas venceu o centro contra as forças mais conservadoras, que foram colocadas de lado na política peruana. Na Venezuela, houve a vitória de Chávez.
Todas essas conquistas têm grande significado para a América do Sul.
Movem forças políticas conservadoras que, há décadas e décadas, só elas, mandavam e desmandavam e cumpriam uma agenda conservadora, atrasada, que afundou a América do Sul em crise, em dívida, em desastre social terrível. Todas essas nações vivenciaram essa realidade. Qual é a situação nova? É que são forças do campo democrático, popular, de esquerda, que estão governando essas nações, que estão dirigindo essas nações. É uma situação nova.
Isso não se deu ainda com a Colômbia. A Colômbia não viveu esse movimento. Por que não viveu? Há poucos anos, Sr. Presidente, as forças populares do campo e da esquerda na Colômbia anunciaram que iriam participar do processo eleitoral. Sabem o que ocorreu, Srªs e Srs. Senadores? Sabem o que aconteceu com os dirigentes das forças populares que participavam das guerrilhas insurgentes contra os governos reacionários da Colômbia quando foram para as eleições?
Foram todos assassinados! Os principais dirigentes que participaram das eleições foram massacrados pelos governantes e pelos paramilitares. Assassinados friamente. Assim, o conflito se mantém há mais de quatro décadas na Colômbia. Qual é o nosso papel? Qual o papel de uma nação, como o Brasil, fronteiriça com a Colômbia, fronteiriça com a Venezuela, amiga do Equador, que tem buscado contribuir com o seu desenvolvimento também puxando essas economias para crescer e se desenvolver? O nosso papel, na minha opinião, não pode ser, jamais, o de fazer coro.
Ora, veja, acompanhando há anos a Colômbia, está exatamente a política do governo norte-americano. São os assessores militares americanos que conduzem aquela política. Agora mesmo, às vésperas da ocupação do Equador, que foi bombardeado pelo exército colombiano, estava lá um assessor militar norte-americano com recursos, com dinheiro, com armas, com munição, com bomba! É assim que tem sido feito aqui na nossa terra, aqui no Brasil, na América do Sul.
É assim que se têm comportado essas forças mais conservadoras para tentar manter essa região como a área de influência, a área de domínio, a área da tutela dessa política mais conservadora e mais atrasada praticada pelos governantes norte-americanos em relação à América do Sul.
Esses países, digamos assim, vão tomando em suas mãos a construção do seu projeto, do seu país, da sua nação. E há reação, reação interna, porque a direita conservadora desses países é vinculada a outros interesses: não querem esse projeto, não querem uma nação com projeto nacional, arrojado, voltado para seu povo, para seu país, para suas riquezas, para sua produção; têm impedido esse crescimento. Quando essas nações buscam desenhar o seu projeto de mais autonomia na região ou de estarem mais integradas à região e não subordinadas, há uma reação muito forte, chegando ao ponto de um conflito interno, como é o conflito na Colômbia. Temos que reconhecer: há um conflito na Colômbia.
Como vamos intermediar para alcançar a paz na Colômbia? Interessa para o Brasil a paz, interessa a paz nas nossas fronteiras para o nosso progresso, para o nosso desenvolvimento. Jamais o nosso tom pode ser o de estimular, criar embaraços para o entendimento naquela região. Creio que deveríamos tratar de fazer algumas incursões sobre este tema: a América do Sul tem condições, as nossas nações têm condições de encontrar o caminho da paz.
A interferência de uma grande potência que exige, que quer, que deseja que tudo corra segundo a sua vontade é que pode ser o maior embaraço para a paz. Talvez o maior interesse é que não tenha paz, porque a paz na nossa região, se nós conseguirmos superar esse conflito na Colômbia, poderá abrir o caminho para, quem sabe, algumas décadas de prosperidade da nossa região, com mais autonomia, com mais interesse entre as nações pelo projeto do seu país e do seu povo, meu caro Senador Eduardo Suplicy.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT – SP) – Prezado Senador Inácio Arruda, quero cumprimentá-lo pela maneira com que está analisando esses conflitos na Colômbia e as diferenças de opinião entre governos da Venezuela, da Colômbia, do Equador e outros. Mas cumprimento-o também pelo enfoque na responsabilidade de nós brasileiros estarmos colaborando para que ali na Colômbia se encontre um caminho de paz, necessário obviamente, baseado em um sentimento de solidariedade e de justiça que possa existir na nação, se instrumentos de políticas públicas, de políticas econômicas vierem a construir esse sentimento de justiça e solidariedade. Por causa disso não mais persistirão as razões que levam uma parte significativa daquele povo a estar em guerra de resistência por mais de 40 anos. É nesse sentido que eu acho que o Brasil pode colaborar.
É importante que, quando se coloca que os Estados Unidos da América, por seu Governo, estariam tentando realizar ações que seriam condizentes com procedimentos os mais adequados ou democráticos, faça-se uma análise severa de que, muitas vezes, os Estados Unidos da América, os seus governos, alimentam e apóiam ações – por exemplo, paramilitares no governo da Colômbia ou junto ao governo da Colômbia – que são exemplos de práticas de torturas, de desrespeito aos direitos da cidadania. Isso precisa estar muito claro. Esses episódios precisam levar em consideração que, muitas vezes, diretrizes e recomendações feitas pelo Governo dos Estados Unidos incidem em erros graves. Eu tive a oportunidade de assistir, no domingo à noite, a algo muito relevante que, felizmente, o Canal Futura apresentou.
Nesse sentido, vejo um mérito na democracia norte-americana, porque os norte-americanos são capazes de fazer uma autocrítica muito importante e saudável sobre o que, por vezes, acontece. Passou no Canal Futura um dos melhores documentários, justamente indicado para o melhor documentário no Oscar, chamado “Taxi to the Dark Side” (Táxi para o Lado Escuro), de Alex Gibney, sobre os abusos dos Estados Unidos contra os prisioneiros de guerra, seja em Abu Ghraib, seja em Guantánamo, seja no Iraque, seja no Afeganistão, abusos que foram ordenados pela Casa Branca, por pessoas da mais alta autoridade. Foi mostrado, de maneira muito clara e bem documentada, que, por vezes, ali há erros muito graves. Precisamos estar atentos a esses erros. Portanto, com o espírito que preside o seu pronunciamento, que é o de todos nós, brasileiros, no sentido de colaborarmos para que haja uma saída de paz, baseada em instrumentos de justiça na Colômbia. É importante que possamos colaborar, inclusive, para que haja a libertação de todos que estejam seqüestrados e presos e, ao mesmo tempo, avançar na direção da justiça para que efetiva paz possa existir num país irmão, como o é a Colômbia.
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB – CE) – Sr. Presidente, nós vamos afunilando o nosso pronunciamento. Talvez precisássemos rever o que está ocorrendo. Há poucos dias, ou há poucos meses, o governo venezuelano patrocinou um episódio, que todos nós deveríamos dizer: puxa, devemos apoiar. Junto com a Senadora colombiana Piedad Córdoba, patrocinou um episódio para libertar prisioneiros que estavam sob o domínio das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, as Farc.
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PCdoB – CE) – Deveríamos todos nós dizer: precisamos associar-nos a esse movimento e estimular o governo colombiano a fazer a troca de prisioneiros. Há centenas e centenas de prisioneiros na Colômbia. Em seguida, um segundo movimento, quando, primeiro, dois presos e depois quatro presos foram libertados pelas Farc. Em vez de dizermos: puxa vida, é uma iniciativa excelente! Vamos apoiá-la. O que fizemos? Os grandes veículos de comunicação no Brasil quase condenaram, de forma uníssona, a iniciativa em vez de fazerem o contrário.
Precisamos associar-nos a esse movimento.
Aí veio o episódio da invasão do Equador, quando mataram os guerrilheiros que estavam dormindo, usando equipamentos de altíssima tecnologia para identificar as pessoas nas florestas e bombardeá-las. O governo colombiano pediu desculpas, mais uma vez, na reunião da OEA, reconhecendo o seu equívoco, mostrando que estava absolutamente equivocado ao invadir um país e ultrapassar completamente os seus limites.
Sinceramente, creio que precisamos tirar lições desse episódio. Uma delas é a de que devemos nos unir num esforço grandioso pela paz na América do Sul. Há um conflito na América do Sul e uma ingerência em nossa fronteira. Na chamada tríplice fronteira do Brasil com a Argentina e o Paraguai, inaugurou-se uma pista colossal feita com recursos americanos. Para quê? Será que é para defender o Paraguai, ou o Brasil, ou a Argentina? Desconfio de movimentos dessa ordem.
Talvez, Sr. Presidente, devêssemos encabeçar no Brasil uma campanha para a retirada de qualquer base imperialista na região, não aceitar essas bases, unindo-nos a todos esses países e dizer: temos capacidade de nos defender.