EUA empurram acordo que valida ocupação criminosa da Palestina


A estagnação das negociações entre Israel e a Autoridade Palestina se evidencia. Embora desaprovado por um setor popular e político palestino expressivo, o plano rascunhado pelos EUA será empurrado pelo presidente Barack Obama ao governo israelense, que também o rechaça, segundo um artigo do jornal The New York Times, desta quinta-feira (27). Enquanto isso, a maior violência na Cisjordânia ocupada sugere crimes de guerra, diz a Anistia Internacional.

Por Moara Crivelente, da redação do Vermelho

Não são inéditas as denúncias às consequências da ocupação militar israelense dos territórios palestinos. A população, extremamente exposta e vulnerável às políticas de um regime de segregação, conforme reconhecido repetidamente pela Organização das Nações Unidas (ONU) e outras não governamentais de defesa dos direitos humanos – inclusive israelenses –, fica sujeita à violência das tropas israelenses, cujos picos de ação repressiva têm culminado em crimes de guerra.

Esta é a indicação mais recente – também já afirmada antes – da Anistia Internacional, organização não governamental de defesa dos direitos humanos. No mesmo sentido, a associação israelense B’Tselem divulga relatórios frequentes sobre os abusos da ocupação militar mantida por Israel sobre os territórios palestinos da Cisjordânia e Jerusalém Oriental, assim como o bloqueio ilegal à Faixa de Gaza.


Mais especificamente, a associação de soldados israelenses “Quebrando o Silêncio” (Breaking the Silence) é outra fonte de documentações extensas sobre as violações dos direitos humanos e a exposição de combatentes e civis palestinos ao mesmo tratamento militar opressivo, sujeitos a um regime jurídico e até político diferente daquele aplicado aos colonos judeus, que se instalaram ilegalmente em terras palestinas, com a cobertura dos soldados. Sua negligência e suporte frente à violência dos colonos contra os residentes palestinos também é outra denúncia recorrente.

Ainda assim, os combatentes que compõem a luta armada de resistência palestina, da mesma forma que os jovens e crianças que lançam pedras contra veículos militares e postos de controle, em protesto contra a ocupação, são tratados exclusivamente como “terroristas”, cuja legitimidade de combate e reação é completamente anulada.

E é assim que os crimes de guerra cometidos pelas autoridades e tropas israelenses ganham espaço informalmente institucionalizado e justificativa através do discurso oficial, na mídia e nos foros internacionais.

Manter a ocupação

É neste sentido em que a recusa do governo israelense ao plano elaborado pelos Estados Unidos para as negociações de um acordo definitivo com a Autoridade Palestina e o próprio “processo de paz” – mais um de uma série extensa – revelam uma assimetria de poder à qual os impulsos pró-diplomacia não têm conseguido responder.

A última tentativa foi o lançamento do período de nove meses para um conjunto em que “todas as questões centrais” estariam sobre a mesa, como disse em julho, no dia do anúncio sobre a retomada das negociações, o secretário de Estado dos EUA, John Kerry. Enganando poucos, os aliados israelenses têm se apresentado como mediadores, embora sejam as suas políticas de “apoio incondicional a Israel” – como declarado por Kerry e pelo próprio presidente Obama – as principais formas de extensão no tempo e no espaço da ocupação militar israelense sobre a Palestina.

E é assim que o governo israelense racista e direitista do premiê Benjamin Netanyahu – cercado de grupos ortodoxos e extremistas que defendem com garras e presas as colônias judias na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental – inventa novas barreiras ao progresso diplomático.

 

As duas principais entre estas barreiras, relevantes para a compreensão das perspectivas daqueles que veem mais um “processo” terminar em nada, é a exigência aos palestinos de reconhecerem Israel como um“Estado judeu” – para o prejuízo racista de todos os não judeus que vivem no país, principalmente os palestinos – e a exigência de manutenção de tropas israelenses em alguns pontos do Estado da Palestina, a ser reconhecido apenas se desmilitarizado.

Enquanto os aspectos políticos da manutenção de tropas israelenses na Palestina é evidenciado pela frustração de uma reivindicação histórica de autodeterminação soberana, independente, de libertação, enfim, digna e justa, os aspectos humanos ficam também expostos através das denúncias frequentes, recorrentes, cotidianas sobre as violações e os abusos dos soldados de Israel contra os palestinos.

Abusos, violações e resistência

Como mencionado, o último de uma série de relatórios que denunciam as ações militares israelenses – não apenas em operações pontuais, mas cotidianamente – foi divulgado nesta semana pela Anistia Internacional. “As forças israelenses estão usando violência excessiva e inconsequente na Cisjordânia ocupada, matando dúzias de palestinos nos últimos três anos, no que pode constituir um crime de guerra,” afirma o texto.

Novamente, trata-se de mais uma denúncia sobre a permissividade e a impunidade das ações violentas dos soldados israelenses nos territórios palestinos, evidenciando o que todas as análises sobre ocupações militares pontuam: a exposição e a vulnerabilidade de uma população ocupada precisa ser extinta, sobretudo em um processo diplomático cujo objetivo central é a “solução do conflito” e a “construção da paz”.

De acordo com dados da própria ONU, 45 palestinos foram mortos na Cisjordânia entre 2011 e 2013, inclusive seis crianças. No fim do ano, entretanto, a escalada da violência levantou preocupações entre palestinos, israelenses e observadores internacionais sobre a iminência de uma terceira intifada, ou levante popular contra a ocupação.

Embora a proliferação dos comitês populares de resistência seja expressiva e positiva, com a definição central de uma luta não violenta, a frustração com mais um processo diplomático sem resultados e a expansão física e administrativa da ocupação podem causar mais uma revolta que culmine em confrontos violentos.

Entretanto, a reação das autoridades israelenses a relatórios como o da Anistia – assim como os relatórios da própria ONU e seu Conselho de Direitos Humanos – é invariavelmente a transferência da culpa pela violência, a repressão e a opressão institucionalizada e sistemática, aos palestinos. Não são poucos os analistas, acadêmicos ou jornalistas israelenses que questionam as suas autoridades – e que também são acusados de traição por fazê-lo – pela manutenção de um regime militar imposto sobre os palestinos, o que pontuam como a própria causa da violência.

Mas às vésperas do fim do prazo para as negociações, em abril, Obama pretende pressionar o governo israelense a aceitar uma proposta de “negociação final” elaborada por um general estadunidense, em companhia do secretário de Estado, que já esteve na região mais de uma dezena de vezes neste período, sem alcançar qualquer avanço positivo.

O chamado “acordo-quadro”, que ainda não seria uma solução, mas um meta-acordo, ou seja, um pacto sobre o que será acordado, após mais um período de negociações, também já foi denunciado pelos palestinos como outra extensão da ocupação, com sugestões para corresponder às “preocupações securitárias” e exigências de Israel, ou seja, a manutenção das tropas israelenses em territórios palestinos, além de uma série de pontos que trazem mais concessões a Israel – como o reconhecimento do “Estado judeu” – e a definição das fronteiras, já rechaçada pelo governo israelense. Resta ver o que sobraria da Palestina, neste plano, para ser “reconhecida”.

 

Fonte: Portal Vermelho

 

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