*Artigo do Senador Inácio Arruda sobre os 25 anos da Constituição Federal publicado originalmente no site da CONTEE
A nossa Constituição da República completa 25 anos. Estive presente durante os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte, não como parlamentar, mas como representante do movimento social. Representei a Confederação Nacional de Associações de Moradores, que defendeu duas propostas importantes que foram objeto de mobilização social e para as quais colhemos mais de 100 mil assinaturas em cada uma. Uma que pedia a suspensão do pagamento da dívida externa e a auditoria nas contas externas brasileiras. Não tivemos êxito na suspensão do pagamento da dívida, mas a Constituição acolheu, nas suas disposições transitórias, a auditoria e, na sequência, tivemos a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a dívida, logo após a Constituinte. É muito importante que aqueles que queiram examinar o impacto do endividamento externo brasileiro examinem o relatório dessa CPI.
A segunda questão foi o capítulo da política urbana do nosso país, alvo de ampla mobilização da sociedade nos dias atuais. Pela primeira vez, uma Constituição tratou, de forma mais adequada, a questão de um país que se urbanizava de forma absolutamente acelerada e que hoje chega a ter quase 85% da sua população morando em cidades. Portanto, a Constituição recepcionou uma das matérias das mais importantes.
Nesta questão, eu participei diretamente, indo à tribuna da Assembleia Constituinte, para defender as emendas populares, emendas que vinham da articulação social, da pressão sindical, das associações comunitárias, dos diretórios e centros acadêmicos, da União Nacional dos Estudantes (UNE), da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes). Essas instituições se reuniram com federações, com confederações, para dar um viés inaudito à Carta, porque, pela primeira vez, a Constituinte recepcionava emendas populares. Era algo inovador. Aquilo não existia antes, era fruto da ascensão social pós-ditadura militar, e num contrafluxo mundial, porque já existia o movimento neoliberal, com Thatcher na Inglaterra; Reagan, nos Estados Unidos; e outros que vinham aniquilando, desregulando, privatizando, desmontando os Estados nacionais.
Uma das matérias mais debatidas na Constituição foi a educação e o capítulo que trata da questão da educação. Os Estados nacionais têm seu papel importante, porque, para responder por educação, ou é o Estado ou fica o ensino sujeito ao abuso daqueles que querem ganhar dinheiro nas costas dos estudantes, dos pais desses estudantes. É o caso a que estamos assistindo agora com a Universidade Gama Filho e com tantas outras espalhadas pelo Brasil, que são verdadeiros desastres. Há as boas instituições privadas, há as excelentes instituições privadas, mas há também as que só querem arrancar dinheiro dos estudantes.
Para dar conta dessas questões essenciais do povo – da educação, da saúde, da mobilidade urbana, da garantia da reforma agrária, da terra para produzir, da questão da dívida agrária e de todas essas questões cruciais do cotidiano da vida da população –, precisávamos de uma Constituição avançada. Tivemos um primeiro ato, que foi a legalização de todos os partidos políticos e a liberdade partidária, e a possibilidade das emendas populares, dando esse direito extraordinário da cidadania. Não eram somente os representantes, era a população diretamente que, através das emendas populares, construíram esta que é considerada a Constituição Cidadã, na palavra do presidente da Assembleia Constituinte, Ulysses Guimarães.
É bom frisar que ela abriga os direitos fundamentais, os direitos sociais, de forma inigualável com qualquer outra Constituição da nossa história e incomparável com muitas outras constituições mais duradouras de muitos países. Também deu substância ao Estado brasileiro, garantindo-lhe um papel importante na construção da economia nacional.
Considero, portanto, que essa é a Constituição que mais garantiu direitos, em todos os tempos. Passou a ser atacada e reformada duramente devido a esse seu viés. Foi atacada pelo seu aspecto avançado, progressista, das liberdades, das garantias.
Ela também foi alvo daqueles que consideravam que foram ampliados demais o respeito aos direitos humanos e às vantagens sociais. Foi essa Constituição que abriu a perspectiva para ser criado, por exemplo, o Fundo de Combate à Fome e à Miséria, que era objeto de uma campanha que se desenvolveu no país inteiro liderada pelo Betinho, o irmão do Henfil. O Fundo depois se alargou com o presidente Lula e, agora, com a presidenta Dilma e vem cumprindo importante papel de inclusão social.
Senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) na presidência da sessãoApós 25 anos, sabemos que a nossa Carta foi uma conquista histórica, que está tendo vida longa no Brasil. Isso significa mais consolidação democrática, mais consolidação das liberdades. Estejamos vigilantes para não permitir que essas conquistas extraordinárias das liberdades, da organização política, dos partidos, se percam! Essa história de ser contra partido é história do retrocesso, é história da direita, é a história do nazismo, do fascismo, e isso nós não queremos nunca mais no nosso país.
Por isso, cumprimento o povo brasileiro, que ajudou a construir, nas ruas e no voto, a Constituição Cidadã, que é o instrumento com o qual devemos defender o Estado de Direito, as liberdades e a democracia.
Inácio Arruda
Senador (CE) e líder do PCdoB no Senado