Memória: discurso de Oscar Niemeyer em 2007, durante sessão em sua homenagem


Um dia um jornalista me perguntou: “Oscar, qual é a palavra que você quer eterna?” Eu disse: “É solidariedade; é isso que eu quero”.

 

O Congresso Nacional comemorou no ano de 2007, o centenário de nascimento do arquiteto Oscar Niemeyer. O homenageado – que projetou os principais edifícios e monumentos de Brasília, incluindo o Congresso Nacional – participou da sessão por meio de videoconferência. A homenagem seria realizada apenas pelo Senado, mas, a requerimento do senador Inácio Arruda (PCdoB-CE), transformou-se em sessão conjunta especial do Congresso.

 

Confira íntegra do discurso de Oscar Niemeyer:

 

O SR. OSCAR NIEMEYER – É difícil para mim, de improviso, responder a essa homenagem tão exagerada, tão amiga que vocês estão fazendo. Afinal, sou um ser humano como outro qualquer, sem a menor importância, que olha para o céu e sabe como somos pequeninos neste mundo difícil de viver. Mas agrada- me sentir que eu tenho procurado manter o meu caminho no sentido de um mundo melhor, todos de mãos dadas, que a gente tenha uma vida mais fraternal, que as pessoas se olhem sem procurar defeitos, achando que cada um tem uma qualidade.

 

O Lênin já dizia que 10% de qualidade era o suficiente. De modo que o queremos, nós comunistas, é tão pouco: é uma vida simples, todos iguais, solidários.   De modo que é nesse sentido que, com o passar dos anos, me sinto tranqüilo comigo mesmo. Lembro que sempre gostei de me examinar um pouco; gostava da solidão, de ficar sozinho, pensar nas coisas, tentar melhorar um pouco. E isso sempre me levou para o caminho certo: saber que o importante é a vida, não a arquitetura.   Quando aqui um jornalista veio me procurar, ele me pediu para falar dos projetos.

 

Não falo não. Para sentir o meu ponto de vista, quando vejo um grupo de jovens na rua, protestando, o trabalho deles é mais importante que o meu.   Arquitetura eu faço, faço com desembaraço; nasci para ficar em cima da tábua, na mesa de desenho; produzo uma arquitetura diferente, não tem surpresa. Enfim, estou tranqüilo no caminho da minha arquitetura, não tenho problemas e é um momento de prazer em que me distraio fazendo o meu trabalho.

 

Mas o importante para mim é isto: é o contato, é procurar a juventude, o momento em que a gente precisa ajudar os mais jovens. Eles chegam com histórias, eles precisam ver que eles não vêem nada. Eles saem da escola como homens especialistas. Só sabem assuntos da profissão. Isso é que a gente tem de combater. Têm de sair sabendo que vai participar de um mundo injusto, que têm de colaborar. De modo que o mundo é cheio dessas coisas, e a gente precisa levar em conta, e a juventude é preciso ser cuidada com mais atenção, sabendo o mundo que espera e pronta a colaborar, porque a vida é só um minuto, pelo menos, que ela seja produzida num clima de fraternidade e boa vontade, as pessoas com a vontade da ajudar as outras. Isso é que é importante.

 

Enfim, eu faço a minha arquitetura com muito prazer. Não tem nada de especial. Procuro dar uma forma diferente, dar forma mais livre. Gosto de desenhar. Eu sou um arquiteto, um desenhista e nada mais. É esse o papel da minha vida. Vou deixar minha historinha e, como todas as outras, vai desaparecer também. É isso. Eu sou realista. Não estou no caminho do Schopenhauer, com o… Estou no caminho de um mundo melhor, de um mundo de paz, de um mundo, enfim, que a gente espera: todos de mãos dadas, vivendo fraternalmente neste curto período que o destino nos oferece.   Acho que o importante é a gente olhar, sentir que é pequeno, que tem que ser solidário. Um dia um jornalista me perguntou: “Oscar, qual é a palavra que você quer eterna?” Eu disse: “É solidariedade; é isso que eu quero”.

 

 

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