Durante a Sessão Solene do Congresso Nacional em homenagem aos 90 anos do Partido Comunista do Brasil, segunda-feira, 26, o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) destacou a atuação parlamentar dos comunistas, “gente oriunda das frações populares do nosso povo”. Em 1928 foram eleitos os primeiros comunistas para o Legislativo: um operário negro, nascido três anos após a Lei Áurea, e um imigrante nordestino que se instalou na então Capital Federal e assumiram as cadeiras na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro.
Inácio fez um relato da atuação das bancadas do Partido Comunista no Congresso, inaugurada na Constituinte de 1945, até os dias atuais: “Na eleição para a Câmara realizada em 2010, o PCdoB foi o que elegeu a maior bancada feminina (seis mulheres em 15 eleitos, 40%). Elegemos, também, a nossa primeira senadora, Vanessa Grazziotin, que integra comigo a nossa Bancada aqui na Casa”. O senador expressou que os vereadores, deputados estaduais e federais e senadores do PCdoB, reafirmam, “90 anos após a fundação, os ideais de construção de um mundo sem exploradores e sem explorados, de paz, democracia e desenvolvimento econômico e social. Reafirmamos a luta pelo socialismo”.
Leia a íntegra do pronunciamento do senador Inácio Arruda:
Senhor Presidente, Senhoras Senadoras e Senhores Senadores, demais presentes
Há muito que abordar na história de um partido que completa 90 anos, que nasceu com o objetivo declarado de construir uma nova sociedade, sem oprimidos e sem opressores, que viveu a mais dura clandestinidade e passou também por períodos de vida legal – sendo este em que estamos, inaugurado em 1985, o mais duradouro –, que atuou no campo e nas cidades, nos movimentos sociais, culturais e nos sindicatos, que se dispôs à luta política, econômica e também teórica, que tem dado contribuições inclusive no terreno dos esportes. O Partido Comunista do Brasil tem uma atividade multifacetada e uma atuação marcante em nosso país e também internacionalmente. Por isso, nesta homenagem que o Congresso Nacional faz aos comunistas brasileiros, vou me deter principalmente na atividade parlamentar comunista.
Fundado em 25 de março de 1922, o Partido Comunista do Brasil foi registrado com o número 1.280 em 31 de maio de 1922 no Cartório do 1º Ofício do Rio de Janeiro, então Capital Federal. Pouco depois, em 5 de julho, devido ao Levante do Forte de Copacabana, foi decretado Estado de Sítio no Distrito Federal e a polícia invadiu e fechou a sede do Partido. O Estado de Sítio só foi suspenso em 31 de dezembro de 1926 e, no dia 5 de janeiro de 1927, o Partido divulgou uma “Carta Aberta” propondo a formação de uma frente política, o Bloco Operário, para as eleições para o Congresso, marcadas para 24 de fevereiro. Além de apoiar a eleição do deputado João Baptista de Azevedo Lima, o Bloco lançou um candidato próprio, o gráfico João da Costa Pimenta que, com Astrojildo Pereira e outros, foi um dos fundadores do Partido. Pimenta não conseguiu o mandato, mas Azevedo foi o primeiro representante no Congresso eleito com apoio comunista.
Em novembro de 1927, o nome da frente mudou para Bloco Operário e Camponês (BOC). Nas eleições municipais de fevereiro de 1928 lançou candidatos em algumas cidades e conseguiu eleger dois intendentes na Câmara Municipal do Rio de janeiro: o farmacêutico e jornalista Octavio Brandão e Minervino de Oliveira, um marmorista negro, nascido três anos após a abolição da escravatura. Para se ter uma ideia das limitações democráticas da República Velha, um dos comícios realizados na campanha dos dois comunistas candidatos pelo BOC foi dissolvido à bala pela polícia, resultando na morte de um operário e na prisão de Minervino e Brandão. A vitória dos dois candidatos levou, pela primeira vez, os comunistas ao Legislativo. Os vereadores do Partido Comunista estavam sempre em confronto com as forças situacionistas, dentro e fora do plenário, o que lhes valeu várias prisões. No final de 1929 foi aprovada uma moção proibindo a propaganda comunista através da tribuna parlamentar. Octavio Brandão denunciou que era inédito, depois de um século de existência da Câmara Municipal, seu órgão oficial deixar de publicar “os discursos pronunciados por dois intendentes. E assim continuou, apesar de nossos protestos, durante o ano de 1930, até que o Conselho foi fechado em consequência do golpe armado de Getúlio Vargas”.
O ano de 1930 seria de eleição presidencial. A direção comunista, buscando aliança com os tenentes, ofereceu a legenda do BOC a Luiz Carlos Prestes, para que ele concorresse à Presidência da República, mas ele recusou. O PC do Brasil lançou, então, candidatos próprios. Foram indicados candidatos ao senado por vários estados.
Apresentaram-se candidatos a deputados federais no Distrito Federal, Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Minervino foi preso várias vezes durante a campanha. Fraudes deslavadas ocorreram na votação e apuração do pleito. O programa eleitoral comunista defendia o reconhecimento da União Soviética pelo Brasil, anistia, autonomia do Distrito Federal, jornada de trabalho de 44 horas semanais, voto secreto, direito ao voto para as mulheres e os analfabetos, redução do limite de idade para votar de 21 para 18 anos.
Em outubro ocorreu a Revolução de 1930, que fechou o parlamento e cassou todos os mandatos. Minervino e Octavio Brandão foram presos e permaneceram encarcerados até 1931. O Partido Comunista só reconquistaria a legalidade em 1945, com o fim do Estado Novo. Participou, então, das eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, quando elegeu 14 deputados e um senador.
Em especial após o Estado Novo, instaurado em novembro de 1937, a atuação do Partido Comunista do Brasil foi violentamente reprimida. Em 1941, quase todos seus dirigentes estavam na cadeia ou no exílio. Em agosto de 1943, Diógenes Arruda, Pedro Pomar, João Amazonas, Maurício Grabois, entre outros, realizaram uma conferência de reorganização do Partido, na Serra da Mantiqueira. Defenderam a união nacional em torno do governo Vargas, contra o nazifacismo e pelo envio de tropas brasileiras para lutar pela democracia na Europa. Em abril de 1945, Getúlio Vargas decretou a anistia, libertou os presos políticos e passou a vigorar no país ampla liberdade partidária. O Partido Comunista do Brasil solicitou, em 3 de setembro, seu registro no Tribunal Superior Eleitoral. Em 1946, com 200 mil filiados, lançou Yedo Fiuza candidato à Presidência da República, que conquistou quase 570 mil votos, aproximadamente 10% dos votos válidos.
A bancada comunista teve atuação destacada na Constituinte. Posicionou-se contra o presidencialismo e propôs um sistema misto com um parlamento forte. Defendeu o direito de greve, a livre organização dos trabalhadores, a jornada de trabalho de no máximo oito horas diárias, inovações na legislação voltadas para a higiene e a segurança no ambiente de trabalho, o Estado laico e a liberdade de culto religioso. Advogou que o direito à propriedade fosse garantido, “desde que não seja exercido contra o interesse social ou coletivo, ou quando não anule, na prática, as liberdades individuais”. A Constituição, promulgada em 18 de setembro de 1946, determinou a realização de eleições para as constituintes estaduais. O Partido elegeu 46 constituintes estaduais em 15 Estados e no Distrito Federal.
No entanto, as forças conservadoras conseguiram fazer com que, em 7 de maio de 1947, o Tribunal Superior Eleitoral, por três votos contra dois, anulasse o registro do Partido Comunista do Brasil. As sedes do Partido e de sua imprensa foram invadidas, depredadas e fechadas. Em Santo André, Estado de São Paulo, o prefeito Armando Mazzo e a bancada de 13 vereadores, todos do Partido Comunista, foram impedidos de tomar posse, pois o TSE anulou os votos que receberam. O mesmo ocorreu com os 15 vereadores eleitos na capital paulista, os 14 eleitos em Santos (SP), os 12 eleitos em Recife e também os eleitos em Olinda, em Pernambuco. Em janeiro de 1948, os mandatos comunistas foram cassados e inclusive vereadores comunistas eleitos pela sigla do PSP de Pernambuco perderam arbitrariamente seus mandatos. Para sanar esta injustiça, aqui no Senado, apresentei, neste mês, o Projeto de Resolução nº 4/2012, cancelando a cassação do Senador Luiz Carlos Prestes, eleito pelo Partido Comunista do Brasil, cujo mandato se extinguiria em 31 de janeiro de 1955, e foi suprimido por decisão da Mesa em 9 de janeiro de 1948. Naquele momento, o deputado federal Pedro Pomar, eleito pela legenda do Partido Social Progressista (PSP) paulista, integrante e voto vencido da Mesa da Câmara, denunciou como “esbulho” o ato declarando vagas “catorze cadeiras de legítimos representantes do povo, que pela ação se revelaram patriotas e os mais firmes defensores dos interesses do povo. A lei, em caso, não é precisamente uma lei, porque é a negação completa dos direitos e prerrogativas constitucionais, mutila o Parlamento, ofende o decoro desta Casa e coloca a soberania da representação popular numa tal dependência dos outros poderes, que nenhum cidadão, sinceramente patriota, será capaz de agora em diante de confiar num Congresso que capitula e abdica do seu poder”.
Impossibilitados de atuar legalmente, os comunistas foram duramente perseguidos, em especial após o golpe militar de 1964. Já então adotando a sigla PCdoB, o Partido Comunista do Brasil denunciou o caráter antidemocrático dos sucessivos governos dos generais, de Castelo Branco a João Batista Figueiredo. Durante os longos anos de ditadura, advogou o voto nulo e, depois, passou a participar do partido de oposição, o Movimento Democrático Brasileiro, MDB, e elegeu, em 1978, o operário Aurélio Peres deputado federal por São Paulo que, no seu segundo mandato, em 1985, assumiu, juntamente com outros parlamentares federais do então PMDB, Haroldo Lima (BA), José Luiz Guedes (MG) e Aldo Arantes (GO), a legenda do PCdoB.
Vale registrar que, nesse período, quando a proposta de eleição direta para presidente da República, do saudoso deputado Dante Oliveira, foi derrotada, João Amazonas, presidente do PCdoB, manteve encontro com o então governador Tancredo Neves, de Minas Gerais, para manifestar o desejo de que ele se candidatasse, no Colégio Eleitoral, à Presidência da República, o que ele acabou por aceitar, tendo por vice-presidente o atual presidente desta Casa. Eleitos em 15 de janeiro de 1985, José Sarney, com o impedimento, por motivo de saúde, do titular, assumiu o comando do Executivo, e passou a ser o presidente definitivo, com o nosso decidido apoio, em 21 de abril, devido ao falecimento de Tancredo Neves. No dia 29 de abril, uma bancada de 12 deputados, entre estaduais e federais, vinculados ao PCdoB, foi recebida em audiência pelo presidente da República. Foi quando o presidente Sarney afirmou que “os comunistas não eram mais clandestinos e que faltava apenas obter a legalidade”. Logo depois enviou emenda constitucional ao Congresso que permitia, entre outas coisas, a legalização de todos os partidos políticos.
Em 1986, os candidatos comunistas voltaram a apresentar-se abertamente com sua legenda, na eleição para a Constituinte. O PCdoB elegeu os deputados federais constituintes Aldo Arantes (GO), Edmilson Valentim (RJ), Eduardo Bonfim (AL), Haroldo Lima (BA) e a atual senadora pelo Partido Socialista Brasileiro, Lídice da Mata (BA). A bancada comunista teve grande destaque, reconhecido pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). A Folha de S. Paulo arrolou os 40 mais destacados constituintes e o líder do PCdoB, Haroldo Lima, estava entre eles, assim como estava entre os oito "campeões de presença". O Partido apresentou 1.003 emendas, elaboradas sempre com a participação de João Amazonas, das quais 204 foram incorporadas ao texto constitucional. Além da apresentação de emendas, debate e votação, a bancada articulou com as demais forças políticas, em entendimentos que resultaram em importantes avanços. E o Partido também atuou junto ao movimento popular na apresentação de emendas e na pressão junto aos constituintes em votações que ampliavam os direitos sociais, trabalhistas e políticos da população brasileira.
O constituinte comunista Aldo Arantes destaca dispositivos constitucionais que contaram com a participação do PCdoB: “O que estabelece a casa como asilo inviolável de cidadão; o que permite a qualquer cidadão poder propor ação popular; o que define o piso salarial proporcional à complexidade do trabalho realizado; o que fixa a jornada de seis horas para turnos ininterruptos de trabalho; o que assegura a liberdade e a unicidade sindical; o que amplia o número de vereadores nos municípios com até cinco milhões de habitantes; o que garante que a revisão da remuneração dos servidores públicos civis e militares será feita na mesma época e com os mesmos índices; o que dá o direito de voto aos maiores de 16 anos; o que reafirma o direito de greve para os trabalhadores; o que estabelece normas para a reforma urbana; e o que define o conceito de empresa de capital nacional”.
Senhor Presidente, Senhoras Senadoras, Senhores Senadores e demais presentes,
Em 1989, no dia 1º de Maio, PT, PCdoB e PSB lançaram Luiz Inácio Lula da Silva candidato à Presidência da República, pela Frente Brasil Popular. O PCdoB participou de todas as outras campanhas presidenciais de Lula, até as duas vitórias consecutivas dele e a eleição da sua sucessora, a primeira presidenta do país, Dilma Rousseff. Em 1994, a bancada comunista na Câmara Federal dobra, de cinco para dez integrantes.
Em 2003, com a posse de Lula na Presidência da República, o PCdoB passa a participar, também, do Governo Federal. Três anos depois, eleito presidente da Câmara Federal, o deputado comunista Aldo Rebelo assume interinamente a Presidência da República, na ausência do país de Lula e do vice, José Alencar.
Nos anos recentes o Partido Comunista do Brasil também inaugurou sua atuação parlamentar internacional, com a presença de representantes do PCdoB no Parlatino e no Parlamento Sul Americano. Atualmente, no Parlasul, a bancada comunista é constituída por mim, pela deputada deputados Manuela D´Avila e deputado Assis Melo. Também na arena internacional, defendemos o aprofundamento da democracia, a valorização dos trabalhadores, a solidariedade entre os povos e a paz mundial.
Assim, senhoras senadoras, senhores senadores e demais presentes nesta Sessão Solene, mesmo que bem mais breve, é também fecunda a atividade do Partido Comunista no Parlamento. Vale ressaltar que seus representantes são gente oriunda das frações populares do nosso povo – inaugurada, como vimos, com nossos primeiros parlamentares, um operário negro e um imigrante nordestino no Rio de Janeiro –, da intelectualidade, como Jorge Amado, de lutadores provados, como Prestes, Amazonas, Pomar, Grabois e tantos outros. Na eleição para a Câmara realizada em 2010, o PCdoB foi o que elegeu a maior bancada feminina (seis mulheres em 15 eleitos, 40%). Elegemos, também, a nossa primeira senadora, Vanessa Grazziotin, que integra comigo a nossa Bancada aqui na Casa. Nossos parlamentares estão vinculados aos movimentos sociais, às lutas sindicais e de moradores, ao combate às discriminações de gênero, cor ou credo, à defesa do Brasil soberano e democrático, ao fortalecimento das relações com os vizinhos latino-americanos e com os países africanos, dos quais tanta gente veio para cá formar o nosso povo. Reafirmamos, 90 anos após a fundação, os ideais de construção de um mundo sem exploradores e sem explorados, de paz, democracia e desenvolvimento econômico e social. Reafirmamos a luta pelo socialismo.
Parabéns aos brasileiros e brasileiras que constroem o nosso país democrático, parabéns à militância que é e faz o Partido Comunista do Brasil.
Era o que eu tinha a dizer,
Muito obrigado.