O filme “O Homem que Engarrafava Nuvens", dirigido por Lírio Ferreira (Árido Movie, Cartola e Baile Perfumado) e produzido por Denise Dummont, recebeu duas estatuetas da Academia Brasileira de Cinema; melhor longa-metragem documentário e melhor trilha sonora. A premiação foi entregue durante a 10.ª edição do Grande Prêmio do Cinema Brasileiro, que reuniu os principais nomes do cinema nacional no Teatro João Caetano, na noite de terça-feira, no Rio de Janeiro.
Sobre “O Homem que Engarrafava Nuvens”
Em tempos em que o samba se mantém entronado como fundamental matéria-prima na produção de música do país, um filme como "O Homem que Engarrafava Nuvens" () pode valer como uma iluminação. O documentário entrega até mais do que promete, a princípio, vender.
Promete uma biografia do cearense Humberto Teixeira (-1979), compositor, advogado, político e criador das leis de direito autoral no Brasil. Mais que isso, parceiro de Luiz Gonzaga em clássicos como "Asa Branca" e "Assum Preto". O Doutor do Baião, como era chamado.
Entrega um poema visual que, abarrotado de informações, depoimentos e imagens históricas, se expande para além do personagem. E busca recolocar o baião como o gênero fundamental da nossa tradição musical.
Defende a importância do baião como, em primeiro lugar, espelho e escudo da identidade do nordestino. O escritor Muniz Sodré contrasta a alta autoestima do sertanejo nas canções de Gonzaga/Teixeira com a imagem "anêmica" com que o escritor Monteiro Lobato descrevia as figuras do interior.
Depois, indica o gênero musical como agente agregador entre Nordeste e Sudeste do país. Isso porque, a partir de sua modernização por Gonzagão, na primeira metade do século 20, o baião levou o homem do sertão ao estrelato, no rádio e no cinema.
Humberto Teixeira acabou por se tornar, aos olhos do público, o lado B dessa história toda, o letrista que nunca aparecia. "Ele era invisível", afirma o americano David Byrne, ex-Talking Heads, em depoimento ao filme.
O desfile de comentaristas dá ritmo à narrativa. Estão lá, dando a palavra, artistas da música, da literatura, da poesia –todos amarrados pela atriz Denise Dumont, filha de Teixeira, que conduz a história enquanto busca descobrir quem de fato foi seu pai.
Os números musicais comprovam a relevância do baião no correr das gerações e dos movimentos musicais por que já passamos –da bossa nova, no fim dos 1950 ("Bim Bom", de João Gilberto, diz: "É só isso o meu baião"), ao manguebeat, nos 1990.
Lírio levou ao estúdio, para interpretações exclusivas, Chico Buarque ("Qui Nem Jiló"), Caetano Veloso ("Baião de Dois"), Gal Costa e Sivuca ("Adeus, Maria Fulô", em dueto de voz e sanfona).
Outros números foram registrados durante a entrega do Prêmio BR de 2002, quando Teixeira foi homenageado. Dessa sessão, saem as participações de Gilberto Gil, Lenine, Elba Ramalho e Lirinha (ex-membro do Cordel do Fogo Encantado).
O filme conta ainda com a participação dos cearenses, Belchior, Fagner, Fausto Nilo, Nonato Luiz, Irmãos Aniceto, Nirez, Calé Alencar, Patativa do Assaré e do senador Inácio Arruda.
Mais do que Humberto Teixeira, sai da sombra a história de um gênero musical.