Oito militares argentinos foram condenados à prisão perpétua


Quinze presos, quatro deles que seguem desaparecidos, foram assassinados na Argentina, na localidade chaqueña de Margarita Belén, em dezembro de 1976, em uma operação conjunta do Exército e da polícia da província do Chaco, que simulou uma fuga. Na segunda-feira (16), oito militares foram condenados à prisão perpétua, acusados pelos assassinatos. É mais um caso de julgamento de militares acusados de crimes durante a ditadura argentina.

Marcos Salomón, em Página/12
Transcorridos 35 anos dos fuzilamentos, dez da reabertura da ação judicial, depois de escutar mais de 120 testemunhas, em 60 audiências orais e públicas, a leitura da parte resolutiva da sentença levou menos de 30 minutos para fazer escutar a condenação à prisão perpétua de oito militares e do único policial sentado no banco dos réus, pelo assassinato de quinze pessoas, quatro das quais permanecem desaparecidas.

Mas nem tudo foi tão simples. A convocatória original, para às 8h30min, apenas deu lugar às “últimas palavras” de Alfredo Chas, que em um discurso politicamente correto já havia se declarado inocente. O policial conseguiu, de forma inesperada, a absolvição.

Depois, a decisão do Tribunal Oral Federal de passar a leitura da sentença para as 17h, que desagradou todo o público, a ponto de desencadear uma reação inesperada: como nunca tinha acontecido ao longo do julgamento, familiares das vítimas e algozes passaram a fustigar os juízes.

Às 17 horas em ponto, Gladys Yunes, presidenta do Tribunal, leu a condenação à prisão perpétua contra Athos Rennes, Ernesto Simoni, Aldo Martínez Segón, Germán Riquelme, Jorge Carnero Sabol, Ricardo Reyes, Ricardo Losito (que já havia sido condenado a 25 anos na ação envolvendo o ex-Regimento de Infantaria 9, em Corrientes) e José Luis Patetta (também condenado a 25 anos, mas na causa Caballero que investigou a repressão ilegal no Departamento de Polícia do Chaco). Em troca, foi absolvido Luis Alfredo Chas, por falta de provas.

Todos os militares foram condenados como “coautores de homicídio agravado, por aleivosia e pelo número de vítimas”.

Com exclamações e lágrimas, familiares das vítimas escutavam as condenações. As condenações de Patetta e Losito foram os momentos de maior festejo, entre aplausos e alguma ironia solta. Mas, em geral, a audiência foi absolutamente tranquila.

Mas toda a calma terminou quando o Tribunal absolveu Chas. Os familiares do policial romperam em pranto (ainda que não tivessem muita esperança, porque, segundo testemunhos, adiantaram o casamento de uma neta do imputado para evitar que, após a sentença, não pudesse assistir a cerimônia) e descarregaram toda sua tensão contra os familiares das vítimas.

Chas, escutou sua absolvição por falta de provas, em pé, com uma certa expressão de surpresa.

Juan Andrés Sla, filho de Néstor – uma das vítimas do massacre – e de Mirta Clara – ex-presa política – pode descarregar sua raiva contra Patetta: “Foi você que assassinou meu pai”, gritou.

Por outro lado, a impotência da nova geração da Pierolada (sobrinhos de Fernando Piérola, que é uma das vítimas do dia 13 de dezembro de 1976 que continua desaparecida) se fez ouvir: “Onde estão os corpos de nossos companheiros, de nossa família?”, perguntavam aos gritos, enquanto a família Chas era retirada da sala.

Em outra parte da sentença, o Tribunal acatou a acusação de falso testemunho apresentada contra o ex-soldado e escritor frustrado Alfredo Maidana. Em troca, não aceitou o pedido da defesa que acusou de falso testemunho a Francisco “Tete” Romero, ministro de Educação. Os juízes também acataram o pedido de falso testemunho apresentado contra o ex-médico policial Orlando Grillo, que representa a cumplicidade civil do Chaco no terrorismo de Estado.

No entanto, os fundamentos completos da sentença serão conhecidos somente no dia 12 de julho, segundo anunciou a juíza Yunnes. Justamente no dia 12 de julho, Néstor Sala, vítima do massacre, estaria comemorando seu aniversário.

No final, o abraço compartilhado entre familiares das vítimas contrastava com o desgosto dos familiares dos acusados. Somente a esposa de Martínez Segón falou com a imprensa, para desqualificar a sentença. Para fazer calar qualquer rumor e como uma maneira de festejar um triunfo contra a impunidade de 35 anos, com os dedos em V ou com o punho erguido, os presentes começaram a cantar o Hino Nacional Argentino.

Mas, diferentemente do que aconteceu na sentença do processo Caballero, quando todos abraçavam os sobreviventes que falaram no julgamento, na sentença pelo massacre de Margarita Belén não havia sobreviventes para abraçar. Por isso, ganhou muito mais força e sentido o Hino quando a sala de audiências cantava: “Oh, juremos com glória morrer”.