Pedestre e ciclista: direito de ir e vir


Apresentei no Senado Projeto de Emenda Constitucional (nº 24/2011) que inclui na Constituição (art. 23) a proteção aos pedestres e aos condutores de veículos não motorizados entre as competências da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

A cada ano morrem quase dez mil pedestres e perto de três mil ciclistas! Ou seja, os pedestres e ciclistas estão ameaçados, o direito de ir e vir está ameaçado, e precisa ser defendido.

O transporte motorizado individual é, sem dúvida, o maior responsável pela crise da mobilidade urbana, especialmente nas cidades mais populosas. A Constituição de 1988 considerou o transporte público como serviço essencial e transferiu para os municípios a responsabilidade de gerir esses serviços e também o trânsito. Porém, poucos municípios tiveram as condições técnicas e financeiras de criar estruturas para planejar, implantar e fiscalizar um sistema eficiente.

A frota brasileira praticamente duplicou nos últimos dez anos e nossas ruas e estradas viraram um caos. Contribui para isso a prioridade conferida ao transporte particular motorizado, em detrimento do transporte público (ônibus, metrô, veículo leve sobre trilho e trens urbanos) e da circulação de pedestres e ciclistas, por exemplo.

Os automóveis ocupam mais de 80% dos espaços viários, mas transportam menos de 30% das pessoas. O transporte coletivo responde por cerca de 29% e a bicicleta por 2,7%. O maior grupo, 38,6%, desloca-se a pé. Boa parte dessas pessoas anda a pé devido à precariedade do transporte coletivo e ao preço alto da tarifa. As bicicletas, os ônibus e as faixas de pedestres acabam sendo vistas como empecilhos para a fluidez do trânsito.

Somados aos problemas de saúde causados pela poluição do meio ambiente, os acidentes de trânsito geram um custo anual de R$ 12,3 bilhões aos cofres públicos, dos quais 78% são de responsabilidade dos automóveis. E mais, 52% dos leitos hospitalares são comprometidos com pacientes vítimas de traumas cuja principal causa são os acidentes de trânsito. São 30 mil mortes, 350 mil feridos e 120 mil deficientes físicos a cada ano. Chama atenção a incidência dos atropelamentos no conjunto dos acidentes fatais: pedestres e ciclistas constituem, respectivamente, 26% e 7% das vítimas. Isto, segundo dados obtidos entre 2002 e2006 pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN).

A inexistência e a inadequação das calçadas revelam uma situação ainda mais grave. Segundo a Associação Brasileira de Pedestres, na cidade de São Paulo, por ano, cerca de 100 mil pessoas são vítimas de quedas nas calçadas. Buracos, falta de pavimentação e inclinações indevidas prejudicam a circulação da população, provocando ferimentos e vitimando especialmente as pessoas idosas, crianças, pessoas com deficiência e mesmo mães transportando seus bebês em carrinhos.

Uma crônica de Carlos Drummond Andrade, “Direito de Ir e Vir”, publicada no Jornal do Brasil de 9 de maio de1982, retrata bem o drama do pedestre, que não é de hoje, apenas em muito se agravou. O poeta queixa-se: “… não sei como se possa andar com as calçadas e o leito das ruas cheios de veículos, sem uma beiradinha para o infortunado pedestre. Fomos definitivamente proscritos da cidade. E não temos para onde ir, pois o progresso chega ao interior, com seu cortejo de máquinas, desde o automóvel até a carreta, passando pela moto, a escavadeira, a britadeira e demais bichos mecânicos incumbidos de obstar o alegre movimento das pernas”.

Drummond finaliza dizendo: “Vamos trabalhar pela afirmação (ou reafirmação) da existência do pedestre, a mais antiga qualificação humana do mundo. Da existência e dos direitos que lhe são próprios, tão simples, tão naturais, e que se condensam num só: o direito de andar, de ir e vir, previsto em todas as constituições… o mais humilde e o mais desprezado de todos os direitos do homem. Com licença: queremos passar”.

A calçada é parte da via pública e deve ter iluminação, sinalização, manutenção permanente, evitando os buracos etc. O Poder Público deve assumir a responsabilidade pela sua manutenção e implantação nos trechos onde há grande trânsito de pedestres. Essas são as razões da PEC do pedestre.
 

Senador Inácio Arruda – PCdoB-CE