Antes de comentar a recente visita do presidente dos Estados Unidos ao Brasil, o senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) registrou que, desde o final da 2ª Guerra Mundial em 1945, "não houve um ano, um mês nem um dia em que essa potência imperialista não estivesse em guerra contra alguma nação". O senador registrou a posição crítica de seu partido em relação à intervenção de países ocidentais na Líbia. Para ele, trata-se "de mais uma invasão do império, mais um ataque sem proporções".
Apesar de reconhecer a importância de o Brasil manter relações próximas amistosas com os Estados Unidos, Inácio Arruda alertou para a necessidade de os brasileiros saberem que, para os governantes norte-americanos, os interesses deles vêm em primeiro lugar.
– Prevalecem nas relações dos Estados Unidos da América os interesses dos Estados Unidos da América. Ponto. Acabou a relação. É assim que é. E nós temos que ter essa consciência, para também colocar a nossa força e a nossa opinião nesse grande trabalho de relações internacionais – disse.
Inácio Arruda lembrou que os Estados Unidos apoiaram diversas ditaduras militares na América do Sul e lamentou que Obama tenha autorizado a incursão militar de seu país na Líbia quando estava em território brasileiro.
– Lamentavelmente, foi do território brasileiro que se deu a ordem para bombardear, novamente, outro país, pelas forças imperiais; é o imperialismo. O que eles querem não são a proteção dos civis, o que eles querem é o óleo da Líbia, é o controle das jazidas de petróleo da Líbia, é isso que quer o império americano e é isso que querem as potencias européias – avaliou o senador.
Íntegra do discurso
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Senadores, agradeço a gentileza da Presidência em estender a sessão para que pudéssemos realizar o nosso pronunciamento.
Sr. Presidente, quero fazer menção à visita do Presidente dos Estados Unidos da América, a maior potência econômica e a maior potência militar de todos os tempos. Um registro, de imediato, é que praticamente desde o final da II Guerra Mundial, Sr. Presidente, até o dia de hoje, não houve um ano, um mês e nem um dia em que essa potência imperialista não estivesse em guerra com alguma nação. É um registro que considero muito importante para marcar a visita do Presidente Barack Obama ao nosso País.
É evidente que o Brasil, mediante a ação de sua Presidenta Dilma Rousseff, busca ampliar os laços de relações com todos, indistintamente. E não poderia jamais deixar de ter uma relação, a mais próxima possível, com a maior nação do mundo economicamente, de influência, de fortes relações. Acho que isso fizemos, nos últimos anos, com mais altivez, com mais atitude, exigindo mais respeito. Lula fez isso de forma extraordinária. Ao mesmo em que era recebido pelo presidente americano, tanto por Barack Obama como por Bush, sempre deixou clara a nossa posição de uma atitude mais firme, mais consequente, mais soberana, mais em defesa da nossa Nação.
A Presidenta Dilma, seguindo essa trajetória, com seu estilo evidentemente – Dilma não é Lula, Dilma é Dilma – fará um Governo com o estilo dela, também defendendo esses princípios do povo brasileiro. Precisamos de soberania, precisamos de ter relações de mais igualdade com a maior nação do mundo. Acho que Dilma fez bem em recebê-lo, em abrir o espaço para que ele aqui estivesse. Acho que faz parte do jogo político, democrático, das relações entre os povos, com aquela consciência de, quem sabe, por trás estar o interesse. E os americanos são ávidos disso. Sempre afirmam claramente: prevalecem nas relações dos Estados Unidos da América os interesses dos Estados Unidos da América. Ponto. Acabou a relação. É assim que é. E nós temos de ter essa consciência, para também colocar a nossa força e a nossa opinião nesse grande trabalho de relações internacionais.
O Brasil tem grande papel na América do Sul, tem grande papel nas relações com países-irmãos do continente africano, com várias nações africanas com quem temos relações de sangue, de vida. Lá eles são os africanos, e aqui somos os brasileiros, com o seu sangue, como temos o sangue europeu, como temos o sangue nativo das nossas tribos e como temos o sangue africano, mas aqui é o Brasil, e o Brasil tem essa força, essa energia nos dias atuais.
Sabemos da necessidade forte dessa relação do Brasil com os Estados Unidos, com a China; do Brasil com a Índia, já citei a África, a América do Sul. Acho que temos condições de cumprir um grande papel, com particularidades e com grandes diferenças de um país imperial e belicoso como os Estados Unidos. É que o Brasil é o País da paz. O Brasil é um País que busca as relações, de fato, amistosas, que quer transferência de tecnologia, que leva nossa tecnologia para a África, para países da Ásia, que busca reciprocidades, que tem relações, portanto, de mais profundidade, de mais raízes. Temos essas condições por não sermos um País belicoso, por não sermos um País que impõe a sua opinião à base do fuzil, à base do canhão, à base do bombardeio. Acho que essa é uma particularidade.
Talvez nas condições da América do Sul, hoje, os nossos povos devessem cobrar com mais força o ato praticado pelos governos dos Estados Unidos da América de apoio às ditaduras da América Latina, de muitas ditaduras, brutais, que mataram, assassinaram, cometeram genocídio, mas todos esses governantes apoiavam os governos americanos de época. E digo isso porque é preciso olhar o que acontece agora no mundo. Vários países estão ocupados por forças americanas.
E faço aqui uma relação direta: no mesmo dia em que recebíamos o Presidente dos Estados Unidos da América, daqui, do nosso território, do Brasil, o governo imperial ordenou o ataque à Líbia. É óbvio que a Líbia tem os seus problemas; estão, lá, se enfrentando. Não é o enfrentamento de inocentes, de civis; é uma luta encarniçada pelo poder na Líbia. Os que são atacados por Kadafi, os que atacam Kadafi, não são gente inocente, são os velhos atores da política do norte da África, dos antigos reinados, das antigas monarquias, que buscam retornar ao poder naquela região do mundo.
No Egito, uma ditadura militar de mais de 50 anos, retirou-se o seu ditador, que se manteve no poder; continua lá. Os militares, que comandaram 50 anos aquele país, continuam comandando. No Bahrein, um regime também próximo das coisas feudais, do ponto de vista do poder, está ali. Na Arábia Saudita não tem problema. Nem no Iêmen, que é o mais pobre entre eles. Todos têm base militar americana – Iêmen, Bahrein. Recepcionam frotas e o exército americano. Nesses lugares parece que não há civis. Não existem civis ali. São dois pesos e duas medidas do regime imperial com seus aliados europeus, antigos impérios já desmoralizados no tempo, que se liquidaram depois da Primeira e da Segunda Guerra Mundial, mas mantêm a sua arrogância: Inglaterra, França. Até mesmo a Itália, do nazifascismo, também se levanta para atacar, invadir. Eles que já dominaram por muitos e muitos anos aquela região do mundo, com atrocidades, com genocídios, com brutalidades sem igual.
É como se nós pedíssemos, meu caro Paulo Paim, que durante mil anos esses povos e essas nações não falassem em direitos humanos; que sempre que se tocasse no assunto de direitos humanos eles baixassem a cabeça, em penitência talvez eterna, pelos genocídios que já cometeram contra a humanidade. Mas continuam como defensores dos direitos humanos.
Quero registrar no dia de hoje que, lamentavelmente, foi do território brasileiro que se deu a ordem para bombardear novamente outro país pelas forças imperiais. É o imperialismo. O que eles querem não é a proteção dos civis, o que eles querem é o óleo da Líbia, é o controle das jazidas de petróleo da Líbia. É isso o que quer o império americano e é isso o que querem as potencias européias. É disso que eles estão atrás. E é preciso ter coragem para denunciar, porque senão a gente fica na mesmice. E o bombardeio, o espetáculo midiático produzido pelas agências comandadas desse centro faz a nossa cabeça.
Você imagina o espetáculo que foi! Com toda a justeza que é praticar relações entre o Brasil e Estados Unidos, porque é justo, é correto, é necessário para o Brasil, mas o espetáculo que se fez aqui não foi brincadeira. Olha, não é brincadeira. Nem o Papa teve um espetáculo de ordem próxima ao que aconteceu com a visita do primeiro mandatário dos Estados Unidos da América.
Por isso, Sr. Presidente, eu quero registrar a nossa posição. A posição do Partido Comunista do Brasil é de denúncia contra mais uma invasão do império, mais um ataque sem proporções, no Norte da África. Nós não comungamos com o regime nem de Kadafi e nem de tantos outros que cometem atrocidades contra o seu povo. Mas nós queremos denunciar a ação do império conjugada, porque não tem exato a mesma dimensão. Ela é mais grave do que as brutalidades que qualquer ditador pudesse cometer naquela região. É muito mais grave do que isso.
Por isso o nosso partido tirou uma nota, que eu faço questão que faça parte dos Anais do Congresso Nacional, denunciando a invasão da Líbia, a atitude de dois pesos e duas medidas.
Quero também registrar a justa posição brasileira no Conselho de Segurança das Nações Unidas quando se absteve, juntamente com a Índia, a China, a Rússia e a Alemanha, de participar de mais um ato dessa ordem, dessa natureza, de terror contra um país inteiro.
Quem podia vetar não vetou. Portanto, a nossa posição foi justa, foi correta e necessária para aquelas circunstâncias.
As Nações Unidas propuseram uma zona de exclusão aérea, mas as forças do império, Estados Unidos à frente, essa vontade da França de querer aparecer como ente de força no mundo, querendo vender os seus aviões para o mundo inteiro… Tomara que não se comprem mais aviões deles e nem dos americanos. Vamos fabricar aqui mesmo os nossos aviões. Se a gente precisar, vamos fabricar aqui no Brasil. Nós temos condições para isso.
Portanto, as Nações Unidas adotaram uma posição. Essa posição das Nações Unidas está sendo atropelada pela OTAN e pelos Estados Unidos, como sempre fizeram, aliás. Não é à toa que o Presidente da ONU foi escorraçado recentemente. De ontem para hoje foi escorraçado, expulso, praticamente, de um local que visitava, porque houve uma reação contra essa posição das Nações Unidas de desrespeito à soberania de uma nação de forma mais completa.
É preciso que a gente deixe essas coisas registradas para examinarmos mais à frente, porque, às vezes, imediatamente a gente não consegue enxergar o que está acontecendo. A gente fica achando apenas que querem tirar ali um ditador da frente de um governo. A gente não consegue perceber mais a fundo a mudança que eles querem naquela nação ou mesmo naquela região do mundo.
Então, fica o nosso registro, o registro do nosso Partido contra a posição dos Estados Unidos e contra essa intervenção, que na verdade é um acinte.
E mais, infelizmente, essa ação foi definida no território do Brasil, mostrando a arrogância do império. É assim que eles agem. Quer dizer, “de qualquer canto do mundo, aciono a minha máquina de guerra e mando bombardear, mando invadir, mando fazer o que eu quiser”.
Então, é essa a nossa opinião, Sr. Presidente, sobre esses episódios da invasão da Líbia, que queremos deixar registrada. Mais à frente vamos examinar, de forma mais tranquila, quem tinha razão nesse episódio, quais são mesmo os interesses belicistas que estão em jogo naquela região do mundo. Vamos examinar. Talvez não demore muito para que a gente consiga enxergar melhor o que está acontecendo naquela região.
Muito obrigado, Sr. Presidente.