Aprovado em 2001, o Estatuto da Cidade apresentou para os municípios brasileiros novas possibilidades de planejamento e de gestão dos seus territórios as quais se voltam para três grandes questões que marcam a história recente de nossa urbanização: a presença de vazios urbanos, a proliferação de assentamentos precários e a ausência de debate sobre o futuro que nos aguarda.
Para tanto, esta lei federal trouxe em seu conteúdo, além de diretrizes gerais, um conjunto de instrumentos a serem utilizados no combate à especulação imobiliária, na promoção da regularização fundiária e na adoção de práticas democráticas de gestão.
Agora que já se passaram dez anos de sua aprovação, é chegado o momento de arriscar uma primeira avaliação, partindo-se da seguinte questão: há o que comemorar? Responderemos a esta indagação com outras perguntas. Nossas cidades estão melhores no que se refere ao combate às desigualdades socioespaciais? Reduziram-se as favelas e as demais formas de ocupação residencial precária? Garantiu-se terreno para implantação de programas habitacionais? A mobilidade urbana e o saneamento ambiental passaram a ser abordados de modo integrado com as grandes diretrizes de estruturação urbana? Podemos afirmar que nossos planos diretores são verdadeiramente participativos?
Seria ingenuidade de nossa parte imaginar que em apenas uma década problemas destas naturezas e dimensões pudessem vir a ser resolvidos. Afinal, estamos diante de problemas que perduram ao longo de séculos e não seria uma década o tempo suficiente para solucioná-los.
Por outro lado, devemos considerar que a lei do Estatuto da Cidade é exitosa pois com ela a condição desigual com a qual nossas cidades foram historicamente produzidas passou a ser legalmente reconhecida. Ao reunir em seu conteúdo instrumentos já testados em algumas administrações democráticas e populares que buscaram corajosamente enfrentar as disparidades sociais, criminalizando especuladores, favorecendo a diversidade social no espaço urbano e fazendo cumprir a função social da propriedade, esta lei passou a indicar que algumas luzes poderiam ser acesas no final do túnel. Centenas de planos diretores foram elaborados ou revistos, trazendo a tona o debate sobre a necessidade de que nossos municípios fossem socialmente mais justos e ambientalmente mais equilibrados.
Todavia, a dimensão organizacional ainda requer maiores cuidados para que esta lei venha a ser implementada no nível municipal. Os passos seguintes, nem sempre dados, seriam no caminho de criar condições de implementação continuada dos planos diretores, suplantando ao nível local a precariedade institucional. Para tanto, é necessário vontade política do executivo e legislativo.
Renato Pequeno
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Professor da Universidade Federal do Ceará (UFC)