Nem o mais ingênuo líder sindical esperava que a luta pela redução da jornada para 40 horas semanais transcorresse sem confrontos entre o capital e o trabalho. Se num primeiro momento da disputa os trabalhadores acumularam vitórias significativas, a conjuntura agora é de alerta ante a contraofensiva do setor patronal.
Nas últimas semanas, o empresariado vestiu as luvas, subiu no ringue e demonstrou que vai vender caro a redução da jornada. As ações do patronato são lideradas por CNI (Confederação Nacional da Indústria) e Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Visam a congelar a tramitação, na Câmara Federal, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 231/95 — que abrevia a carga de trabalho semanal de 44 para 40 horas. A redução, segundo a OIT (Organização Internacional do Trabalho), beneficiaria cerca de 18,7 milhões de trabalhadores.
Em artigo publicado na Folha de S.Paulo em 23 de março, o primeiro vice-presidente da Fiesp, Benjamin Steinbruch, alardeou que a redução da jornada enfraqueceria a indústria nacional e teria efeito antidesenvolvimentista. Sob a ótica empresarial, as condições de trabalho são secundárias e não devem comparecer ao debate. “A busca do objetivo maior do bem-estar”, escreve Steinbruch, “não pode comprometer a sobrevivência dos empregos”. O manda-chuva da Fiesp quer abortar agora a votação da PEC 231/95 — uma “camisa de força constitucional”, segundo ele —, alegando que o “clima eleitoral” de 2010 prejudica o debate.
Já em 6 de abril, no lançamento da Agenda Legislativa da Indústria — 2010, o empresariado voltou à carga. O documento da CNI, entregue aos presidentes da Câmera Federal, Michel Temer, e do Senado, José Sarney, faz lobby ostensivo contra a diminuição da jornada de trabalho, reiterando o fantasma do colapso industrial. Na semana seguinte, lideranças patronais foram pessoalmente ao Congresso para exigir dos deputados um compromisso contra os trabalhadores.
É preciso reagir a cada uma dessas falácias. Segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a redução da jornada para 40 horas semanais pode levar à rápida criação de 2,3 milhões de empregos, ampliar a formalização do mercado de trabalho, além de melhorar a qualificação e a qualidade de vida dos trabalhadores.
Uma nota técnica divulgada pelo Dieese é ainda mais enfática. Segundo o texto, os efeitos de uma jornada menor “poderiam criar um círculo virtuoso na economia, combinando a ampliação do emprego, o aumento do consumo, a elevação dos níveis da produtividade do trabalho, a melhoria da competitividade do setor produtivo, a redução dos acidentes e doenças do trabalho, a maior qualificação do trabalhador, a elevação da arrecadação tributária — enfim, um maior crescimento econômico com melhoria da distribuição de renda”.
É falsa também a grita de que a luta pelas 40 horas consiste em casuísmo do governo Lula. Trata-se, sim, de uma reivindicação histórica da classe trabalhadora. Tanto que a Campanha Nacional pela Redução da Jornada, promovida pelas centrais sindicais, começou em 2003 — e não às vésperas de tal ou qual eleição. O que deu vitalidade e consistência à proposta foi, acima de tudo, a unidade e a perseverança das seis centrais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho — CUT, Força Sindical, CTB, UGT, Nova Central e CGTB.
A pressão dos trabalhadores culminou numa grande conquista em 30 de junho de 2009, quando a Comissão Especial da Câmara aprovou relatório favorável à PEC das 40 horas. Com isso, a medida está pronta para ir a plenário — só precisa entrar na pauta da Mesa Diretora. Michel Temer chegou a apresentar uma proposta alternativa, que reduziria a jornada gradualmente — para 43 horas semanais em 2011 e 42 horas no ano seguinte. O patronato, porém, não aceita sequer discutir saídas intermediárias. Assim, é real o risco de a PEC das 40 horas ficar parada indefinidamente na Câmara.
A luta entre capital e trabalho mudou de cenário, mas os trabalhadores não estão nas cordas, nem tampouco beijaram a lona. Daí a importância de reagir em tempo à campanha patronal e manter a mobilização. Foi o que fizeram as centrais na semana passada, no protesto em frente à Fiesp — e devem fazer em 1º de junho, durante a Conclat (Conferência Nacional da Classe Trabalhadora). Por sua relevância e abrangência, a redução da jornada de trabalho é a prioridade máxima dos trabalhadores desta geração.