Quando a moça da cidade chegou
veio morar na fazenda,
na casa velha…
Tão velha!
Quem fez aquela casa foi o bisavô…
Deram-lhe para dormir a camarinha,
uma alcova sem luzes, tão escura!
mergulhada na tristura
de sua treva e de sua única portinha…
A moça não disse nada,
mas mandou buscar na cidade
uma telha de vidro…
Queria que ficasse iluminada
sua camarinha sem claridade…
Agora,
o quarto onde ela mora
é o quarto mais alegre da fazenda,
tão claro que, ao meio dia, aparece uma
renda de arabesco de sol nos ladrilhos
vermelhos, que — coitados — tão velhos
só hoje é que conhecem a luz doa dia…
A lua branca e fria
também se mete às vezes pelo clarão
da telha milagrosa…
Ou alguma estrela audaciosa
careteia no espelho onde a moça se penteia.
Que linda camarinha! Era tão feia!
— Você me disse um dia
que sua vida era toda escuridão
cinzenta, fria, sem um luar, sem um clarão…
Por que você na experimenta?
A moça foi tão vem sucedida…
Ponha uma telha de vidro em sua vida!
2010 – Ano do Centenário de Rachel de Queiroz