Reduzir a jornada de trabalho é gerar emprego


De autoria do senador Inácio Arruda, enquanto ainda deputado federal, a Proposta de Emenda a Constituição – PEC 231/95 propõe a redução da carga máxima semanal da jornada de trabalho, de 44 horas, como previsto atualmente no texto constitucional, para 40 horas e aumenta o valor da hora extra de 50% do valor normal para 75%. A proposta mantém as demais regras contidas na Constituição: jornada diária máxima de oito horas e possibilidade de compensação de horários e de redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Apresentada em outubro de 1995, a proposta foi admitida um ano depois, em 1996,  pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Em 1997 foi criada uma comissão especial para analisar a proposta, que não concluiu seu trabalho. A proposta foi arquivada em 1999, em razão da mudança de legislatura, sendo desarquivada em seguida e arquivada novamente em 2003 e em 2007.

Aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça, a PEC foi distribuída em 08 de dezembro de 2008 pelo então presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia a uma comissão especial. Tendo como relator o deputado Vicentinho (PT/SP), o texto da PEC foi aprovado por unanimidade nessa Comissão em 30 de junho de 2009, em um plenário lotado por cerca de mil representantes das centrais sindicais.

O Senador Inácio Arruda fez questão de estar presente à reunião, parabenizando a comissão e destacando o apoio das centrais sindicais para essa aprovação histórica: “Vamos articular uma ampla marcha pela aprovação rápida dessa matéria, desta vez no plenário”, conclamou.

Em agosto, a Câmara dos Deputados realizou uma Comissão Geral, no Plenário da casa, para discutir o assunto. Pela primeira vez, representantes dos trabalhadores e do empresariado puderam debater a proposta, cada uma apresentando seus argumentos.  Agora, o texto da PEC aguarda a votação em dois turnos pelo plenário da Câmara. Depois disso, segue para o Senado, sendo votada também em dois turnos. A PEC não precisa da sanção do Presidente da República, sendo promulgada diretamente pelo Congresso Nacional.

Redução da jornada ao redor do mundo
A luta pela redução da jornada de trabalho não é apenas uma questão parlamentar. Acompanha uma antiga aspiração dos trabalhadores em todo o mundo, fazendo parte dos embates entre capital e trabalho. A redução de jornada busca o reconhecimento de direitos e pretende elevar a condição material e espiritual dos que produzem as riquezas, em contraponto aos que apenas acumulam riquezas ao se apropriar livremente dos resultados do processo produtivo.

Assim, reduzir a jornada de trabalho sem perdas salariais passa a ser uma questão fundamental para o trabalho — e não apenas para sua humanização, mas pelo processo de socialização que é inerente à medida.

Ao longo da História da humanidade, a jornada foi se ajustando na exata medida das lutas e da correlação de forças predominantes em cada período do desenvolvimento das forças produtivas e das relações sociais de produção. De início, não havia limites de carga horária e o repouso do trabalhador praticamente inexistia. No final do século XIX e início do século passado, quando surgiram as primeiras indústrias no Brasil, a jornada era de cerca de doze horas diárias, totalizando até 3.600 horas por ano, semelhante ao tempo de trabalho na época da revolução industrial da Inglaterra, um século antes.

Nesse início da industrialização brasileira, as jornadas diárias eram fixadas, reduzidas ou ampliadas de acordo com a vontade do empregador, despertando, invariavelmente, acentuada rebeldia diante da estafante exploração. Em 1907 ocorreu a primeira grande greve geral, na qual a principal reivindicação era a redução da jornada para 8 horas por dia, colocando o movimento sindical brasileiro próximo às reivindicações dos trabalhadores dos países desenvolvidos da Europa e Estados Unidos.

A paralisação, iniciada em São Paulo, irradiou-se por algumas grandes cidades do interior paulista, como Santos, Ribeirão Preto e Campinas, atingindo também o Rio de Janeiro. Houve adesão das principais categorias profissionais da época: chapeleiros, pedreiros, metalúrgicos, gráficos, carvoeiros, sapateiros, carpinteiros, costureiros, marceneiros, empregados no serviço de limpeza pública e trabalhadores nas indústrias têxteis e de alimentação.

A greve foi parcialmente bem-sucedida, com maior sucesso nas pequenas empresas, onde os trabalhadores conquistaram a redução de jornada de trabalho diária para cerca de 10 horas — em algumas delas foi conquistada a jornada de 8 horas. Uma vitória muito importante, pois havia jornadas muito prolongadas: os carvoeiros do Rio de Janeiro, por exemplo, chegavam a trabalhar 14 horas por dia.
A cada conquista dos trabalhadores, instrumentalizada na legislação vigente a contragosto pelas classes proprietárias dos meios de produção, vem aumentando os espaços de liberdade que, por sua vez, se contrapõem ao predomínio da alienação.

Assim, de uma prolongada jornada em ambiente de escravidão, o tempo dedicado à produção, influenciado pela elevação da produtividade e às conquistas trabalhistas, foi se reduzindo gradualmente de tal forma que em países como a França, onde o contingente de trabalhadores é bem inferior, a jornada é de 35 horas semanais. Lá, a redução gerou cerca de 350 mil empregos entre 1998 e 2002, sem repercussões negativas na situação das empresas.

Outro exemplo vem da Alemanha, onde a história da redução da jornada tem episódios exemplares. Em 1962, o IGMetall (Sindicato dos Metalúrgicos), obteve a primeira vitória na luta pela redução da jornada de trabalho, que passou a ser de 42,5 horas semanais e, em 1967, reduziu-se para 40 horas. Em 1984, houve redução das 40 para 37 horas. Em 1990, após uma greve de seis semanas, conquistou-se um contrato coletivo que estabelecia a redução gradual da jornada de trabalho, de 36 horas, em 1º de abril de 1993, até atingir 35 horas semanais, a partir de 1º de outubro de 1995.

Com isso, os trabalhadores passaram a dispor de uma fatia maior de seu tempo do que a destinada à estrita produção da força de trabalho — na qual hoje se alimentam e repousam menos que o suficiente para a estafante jornada do cotidiano.

Passam a dispor de tempo para atividades tão diversas quanto seja diversificada a sua inclinação pessoal — do lazer à cultura, da participação esportiva à política, sindical ou partidária. E, mais que isso, participam da oportunidade de criação de novos empregos e da ampliação do contingente de trabalhadores que se integrará à produção, fortalecendo os mecanismos de transformação econômica e social em nosso País.

A redução da jornada é uma forma de valorização do trabalho e deve ser encarada não como obstáculo, mas como fonte de crescimento econômico e alicerce de um projeto nacional soberano. E isso não só significa mais tempo livre para o trabalhador, mas, sobretudo, a abertura de outras oportunidades no mercado de trabalho.