O Comitê de Política Monetária (Copom) interrompeu nesta quarta-feira () a sequência de cortes que vinha desde janeiro na taxa básica de juro. A taxa Selic foi mantida em 8,75%, sem viés e por unaimidade. Com isso, o Brasil, segundo projeção da Uptrend Consultoria Econômica, manteve-se como o quarto país com maior taxa de juro real no mundo, em um ranking de 40 países.
A Uptrend relaciona os juros mais altos que a Selic: China (juro real de 7,2%, mas a economia deve crescer 8% este ano), Tailândia (9%), Argentina (7%), Brasil (5%) e Malásia (5%). Nos cinco últimos lugares, ou seja, os menores juros, estão Inglaterra (-1,3%), Chile (-2,4%), Israel (-2,9%), Índia (-5,5%) e Venezuela (-9,0%).
O economista-chefe da Uptrend Consultoria Econômica, Jason Freitas Vieira, comentou que "até o décimo lugar, o Brasil continua sendo um bom pagador de juros para os investidores".
Ciclo de baixa abortado
A decisão do Copom abortou o ciclo de relaxamento monetário iniciado no início do ano, que reduziu os juros básicos em 5 pontos percentuais. Em janeiro houve corte de 1 ponto, em março 1,5 ponto, abril 1 ponto, junho 1 ponto – trazendo o juro nominal pela primeira vez para a faixa de um dígito – e julho 0,5 ponto.
A interrupção quebra as expectativas de que a taxa de juros venha a recuar para níveis civilizados. No mercado, a previsão mais otimista é de mais um corte de 0,25 ponto até o fim do ano. Há quem fale até em "viés de alta". O Copom voltará a se reunir em 20 e 21 de outubro.
"A parada mostra que (os membros do Copom) acabaram o processo e vão ficar um bom tempo com a taxa nesses níveis", afirmou o economista-chefe do WestLB, Roberto Padovani. Ele estimou o "bom tempo" em até meados de 2010.
A última ata do Copom, divulgada no final de julho, já havia indicado a interrupção dos cortes, falando de "uma postura mais cautelosa" para garantir recuperação consistente da economia. A justificativa do comitê para a decisão anunciada nesta quarta-feira foi a seguinte:
"Tendo em vista as perspectivas para a inflação em relação à trajetória de metas, o Copom decidiu manter a taxa Selic em 8,75% ao ano, sem viés, por unanimidade. Levando em conta, por um lado, a flexibilização da política monetária implementada desde janeiro, e por outro, a margem de ociosidade dos fatores produtivos, entre outros fatores, o comitê avalia que esse patamar de taxa básica de juros é consistente com um cenário inflacionário benigno, contribuindo para assegurar a manutenção da inflação na trajetória de metas ao longo do horizonte relevante, e para a recuperação não inflacionária da atividade econômica."
Como justificativa alegada para manter o quarto juro real mais alto do mundo, apresenta-se os dados recentes de produção e emprego, que indicam retomada da atividade econômica, após a forte desaceleração desencadeada pela crise global.
A produção industrial cresceu mais do que o esperado pelo mercado em julho e de forma mais disseminada, com a maioria dos setores apresentando desempenho positivo na comparação com junho.
O desemprego também surpreendeu positivamente em julho, quando atingiu o menor patamar desde dezembro, de 8%.
O uso da capacidade instalada, indicador destacado no comunicado do BC, interrompeu em junho a trajetória de alta que durava quatro meses.
Mais críticas
Como de costume, os setores do capital produtivo e as entidades sindicais reagiram com avaliações críticas e condenatórias.
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou em nota à imprensa que a interrupção da queda do juro foi "inaceitável", uma vez que a indústria ainda sofre "efeitos recessivos" da crise.
A CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) diz em nota assinada por seu presidente, Wagner Gomes, que "não tem dúvidas de que representa os interesses nacionais e populares quando vem a público com o objetivo de manifestar seu firme repúdio a mais este desatino do Banco Central". Veja a íntegra:
"Copom faz o jogo dos especuladores em detrimento da nação"
"Numa decisão que frustra as expectativas da maioria da nação e joga água no moinho dos especuladores, divulgada nesta quarta-feira (), o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) manteve a taxa básica de juros em 8,75% ao ano, interrompendo uma sequencia de cinco modestos cortes consecutivos na Selic iniciada em janeiro.
Em nota distribuída após a reunião, os integrantes do comitê asseguram que o atual nível da taxa de juros é capaz de garantir a recuperação da economia sem gerar pressões inflacionárias. Não é o que pensa a maioria da nação, as centrais sindicais, as empresas dedicadas à produção e os que têm senso crítico. A CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil) rechaça o falso argumento do BC e repudia a política monetária conservadora, que mantém o país entre os primeiros colocados no ranking mundial dos juros reais altos.
Os "especialistas" do Banco Central sempre procuram dourar a pílula, apresentando suas decisões como eminentemente técnicas e apolíticas. Arvoram uma sabedoria que no fundo não possuem. No final do ano passado, quando a indústria já estava mergulhada na recessão, o Copom ainda manifestava preocupação com o "aquecimento" da economia para justificar os juros altos, fonte dos lucros fáceis e exagerados abocanhados pela oligarquia financeira. Não foi a única vez que o órgão se enganou e foi desmentido pelos fatos.
A manutenção da taxa Selic a 8,75% premia a usura, alimenta a ganância dos especuladores e contraria frontalmente os interesses da classe trabalhadora. Seus efeitos, sobejamente conhecidos, são perversos para o país, afetando principalmente os mais pobres: redução dos investimentos e da capacidade de crescimento da economia, estagnação, mais desemprego e arrocho dos salários. É preciso também ressaltar que o Brasil ainda não se recuperou dos efeitos da crise mundial do capitalismo.
A maioria da nação tem se pronunciado contra a alta dos juros. A CTB não tem dúvidas de que representa os interesses nacionais e populares quando vem a público com o objetivo de manifestar seu firme repúdio a mais este desatino do Banco Central."