Música de Martinho da Vila dá tom na festa de 84 anos do PCdoB


Os versos da música de Martinho da Vila deram o “Tom Maior” às comemorações do 84º aniversário do PCdoB, nesta Quarta-feira (), no Salão Nobre das Câmara dos Deputados. A pedido do presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP), o cantor, que se filiou ao Partido no auge da crise política do ano passado, cantou a música com que encerrava as reuniões do grupo Opinião. A música fala sobre o nascimento de uma criança, lembrou Martinho, cantando:


“Eu hei de ver você ninar, ele dormir/
fazer andar, falar, cantar, sorrir/
E quando ele crescer/
vai ter que ser homem de bem/
Vou ensiná-lo a viver/
onde ninguém é de ninguém/
Vai ter que amar a liberdade/
só vai cantar em tom maior/
vai ter a felicidade de ver o Brasil melhor”.


Os aplausos à música de Martinho se repetiram para as falas dos oradores, que se revezaram ao microfone. Muitos destacaram a luta atual do Partido para romper a cláusula de barreira e manter-se no espaço político, “onde é uma referência para a esquerda”, lembrou o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP).


O presidente nacional do Partido, Renato Rabelo, também definiu o tom no discurso de abertura da solenidade, que reuniu cerca de 200 pessoas, entre parlamentares de diversos partidos – aliados e de oposição —, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), líderes sindicais e representantes de movimentos populares.


Aos representantes do movimento estudantil coube puxar as palavras de ordem que são tradição de longos anos nas festas e eventos do Partido. Entre um discurso e outros, eles gritavam: “1, 2, 3, 4, 5 mil e viva o Partido Comunista do Brasil”.


Contra a cláusula de barreira


Após falar sobre a trajetória de 84 anos do partido mais antigo do Brasil, Renato Rabelo fez duras críticas ao procedimento de cláusula de barreira de 5%. “Essa cláusula que vem do regime militar e que conseguimos revogar junto com o entulho autoritário, volta a vigorar”, afirmou.


As palavras duras de Renato ao definir a cláusula de barreira como uma “deformação” arrancaram aplausos da platéia. “É uma cópia mal feita do sistema alemão, porque lá o sistema é parlamentarista e unicameral, onde se decide quem vai governar o país. No sistema brasileiro, com presidencialismo, medir representatividade de um partido só com número de votos para Câmara Federal é uma deformação”, afirmou o líder comunista.


Renato Rabelo concluiu a fala, lembrando que “o PCdoB nunca se deteve diante das ameaças à sua existência. Por sua trajetória de longa existência, demonstra que é um partido que tem grande capital – seus quadros, seus militantes, seus amigos e seus aliados”, e destacou como a causa principal do Partido a união do Brasil, “democrático, soberano, justo, amante da paz e solidário, com os povos do mundo. Brasil que possa construir condições para nova sociedade socialista”.


O presidente do Senado também falou sobre o desafio das cláusulas de barreira. Para Calheiros, o mecanismo “não pode servir como meio para restringir as ações de agremiações de longo histórico de luta a serviço do povo brasileiro como o PCdoB”. E se reafirmou o seu engajamento “nesta luta sobre a reforma política que ainda precisa ser feita nesse país”.


“É possível se manter fiel aos ideais”


As palavras de Renan, assim como as do presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, foram dirigidas à história do Partido. Renan contou detalhes da criação do Partido, fundado em uma reunião no dia 25 de março de 1922, em Niterói, no Rio de Janeiro, em que participaram um operário, dois alfaiates, um eletricista, um jornalista, um barbeiro, um gráfico e dois funcionários públicos oriundos de estados com Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Pernambuco e São Paulo.


Renan lembrou os momentos de perseguição violenta sofrida pelo Partido. E enalteceu a resistência dos comunistas nesses momentos. “Eu considero que resistir ao regime militar e lutar pela democracia foi uma das maiores contribuições do PCdoB à sociedade brasileira”, afirmou.


“A atuação do PCdoB, junto a outros partidos políticos, se mostrou decisiva para o restabelecimento do regime democrático”, disse Renan, acrescentando que “o exemplo desse partido mostra ser possível se manter fiel aos ideais, sem deixar de lado o compromisso com a democracia”.


Martinho: “Grandeza se mede pela história”


Martinho da Vila foi uma atração á parte na festa. Mexeu com a platéia, que reagiu com aplausos e palavras de ordem, quando o sambista justificou a sua opção pelo Partido. “Quando me perguntam porque eu me filiei ao PCdoB e não a um partido grande, eu respondo que a grandeza se mede pela história, pelo passado, pelo que foi feito”, disse.


Em seguida, explicou, como tem feito em várias entrevistas, por que optou em se filiar a um partido num momento de crise política. E mais uma vez recebeu aplausos ao explicar que “exatamente nesse momento é que precisamos nos engajar e se filiar ao partido, porque democracia sem partido não existe”, afirmou.


Martinho apresentou ainda outras razões para ser um comunista, embora tenha admitido, arrancando risos do público, que a palavra ainda causa medo a muitas pessoas. “Os jornalistas que me deram força no começo da minha carreira são todos comunistas; os intelectuais amigos são todos comunistas; e quando eu visitei a África pela primeira vez, todos os países eram colônias e hoje são independente por ação da antiga União Soviética”, explicou.


Companheiros e camaradas


O presidente do PT, Ricardo Berzoini, que também falou na solenidade. Elogiou a atuação de Renato como presidente do Partido; de Aldo como presidente da Casa e a “combativa bancada” do PCdoB. Numa breve saudação e com a cumplicidade de aliado, Berzoini disse: “Em nome dos 800 mil filiados e filiadas do PT, saúdo este Partido que, ao longo de sua história – 84 anos, o que é um marco na história da organização partidária brasileira — sempre esteve ao lado do povo, dos interesses nacionais e foi uma trincheira de resistência da luta democrática”.


Berzoini disse que “o PT, que tem 26 anos de existência, é herdeiro dessas lutas que o PCdoB ajuda a organizar no nosso país”. Acrescentou que “o PCdoB é um partido companheiro e o PT, para o PCdoB, é um partido camarada”.


Fidelidade ao povo e à Nação


Aldo Rebelo fez um paralelo entre a história do PCdoB e a do Brasil, para destacar que “o Partido nasceu num dos momentos em que os clarões da luta libertária se acenderam sobre o território nacional”. Ele lembrou a Semana da Arte Moderna, os 18 do Forte de Copacabana — duas outras datas de 1922 — e o movimento operário que se organizava nas primeiras fábricas do Brasil.


Aldo afirmou que “o Partido carregou em sua trajetória a marca de fidelidade ao país, à nação e ao povo. Maior patrimônio é a afirmação de suas convicções histórias de amor à liberdade e dedicação ao povo brasileiro, principalmente os mais pobres e sofridos, os que vão à margem da história construindo, com lágrimas e sangue, mas também com alegria da vida, o tecido da existência nacional”.


Também falou sobre “a necessidade de união de outras forças políticas, sociais, econômicas e intelectuais para romper o cerco que impede o pleno desenvolvimento do Brasil, a ampliação e aprofundamento da democracia”. E aproveitou a data festiva para manifestar gratidão aos militantes e também aos aliados, “todas as forças políticas com que partilhamos hoje e ontem essa trajetória”. Para Aldo, “o Brasil, que se apresenta como grande experiência civilizatória, não pode ser apenas promessa de progresso e democracia, mas que seja realidade e usufruída por todo o povo brasileiro”.


Trajetória histórica


Surpreendendo a platéia com seu conhecimento, o presidente do Senado narrou vários momentos de perseguição e protagonismo na história do Partido. Ele destacou o enfrentamento de militantes famosos como Amazonas, Grabbois, Pomar, Arroyo, Elza Monnerat, “que se esforçaram para manter vivas crenças em períodos desfavoráveis como a ditadura Vargas”. Mas lembrou também os momentos “de glória”, como as eleições de 1945, quando o Partido elegeu um senador e 14 deputados federais.


Renan lembrou ainda quando, “considerado ilegal e na clandestinidade, (o Partido) enfrentou disputas internas que levaram à sua divisão em 1962”. E acrescentou fatos mais recentes: a legalização em 23 de maio de 1985, no governo Sarney, e eleição de cinco deputados constituintes, “que tiveram brilhante atuação na defesa do regime democrático e dos direitos das camadas mais desfavorecidas da população”. Atualmente, o partido conta com 11 deputados federais e um senador.