Antes da Cúpula, Fundações debatem Brasil e Brics em Fortaleza


Antes da Cúpula, Fundações debatem Brasil e Brics em FortalezaDebater o Brics por diferentes prismas uniu as Fundações Maurício Grabois, Leonel Brizola – Alberto Pasqualini, Perseu Abramo e Ulysses Guimarães. Juntas, elas realizaram na tarde desta segunda-feira (14), na Assembleia Legislativa do Ceará, a oficina “Brasil e o Brics”.

Representantes do PCdoB, PDT, PT e PMDB, além de pessoas ligadas aos movimentos sociais e à economia, participaram do seminário que faz parte da programação que acontece simultaneamente à 6ª Cúpula do Brics, que reúne chefes de estado dos países que compõem o bloco: Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, marcado para os dias 14 e 15 de julho, em Fortaleza, e 16 de julho, em Brasília, e cujo tema central é “Crescimento inclusivo: soluções sustentáveis”.

Na abertura do encontro, Leocir Costa Rosa, membro da Fundação Maurício Grabois, destacou a união das entidades partidárias para debater o tema de interesse nacional e mundial. Ele citou as principais questões a serem debatidas durante a Cúpula como de extrema relevância. “Fortaleza está no centro do mundo, pois aqui poderão ser ratificadas a criação do banco do bloco e ainda a confirmação do fundo anticrise a ser utilizado pelos países que dele fazem parte”, destacou.

Representando a presidência da Assembleia Legislativa do Ceará, o deputado estadual Lula Morais (PCdoB-CE) também destacou o protagonismo do Estado neste momento decisivo. “Além de termos sediado seis jogos da Copa, maior evento esportivo do planeta, Fortaleza também passa a ser destaque neste encontro que reúne os principais países emergentes do mundo. Aqui serão abordados temas convergentes e também as diferenças entre cada membro e temos orgulho de fazer parte deste encontro histórico para o mundo”, ratificou.

O economista Marcio Pochmann, membro da Fundação Perseu Abramo, enalteceu o local escolhido para a realização da 6ª Cúpula do BRICS. “A reunião ser realizada em Fortaleza mostra o dinamismo do federalismo e a importância de estados fora do eixo Rio – São Paulo, valorizando a diversidade regional do Brasil”. Ele também destacou “o esforço das fundações de construir convergências, do ponto de vista programático, para a difusão do conhecimento” e ainda analisou o efeito da crise de 2008 para o BRICS. “O ritmo de expansão desses países, se comparado ao período anterior a ela, é quase a metade do que registravam antes de 2008. Este é um momento importante, pelo ponto de vista da economia internacional, para decisões como a criação do banco”, exemplificou.

Chico Donato, da Fundação Ulysses Guimarães, e Cristina Luz, da Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini, também enalteceram a iniciativa da atividade conjunta, que propiciou o aprofundamento do tema e a importância de ele ser levado, em debate, para as bases partidárias. Eles também propuseram a continuidade da união das entidades para discutir temas futuros, dentre eles a reforma política.

Mundo multipolar

Monica Hirst, professora titular de Relações Internacionais da Universidad Nacional de Quilmes, Argentina, falou sobre o Brics e a construção de um mundo multipolar. Em sua intervenção, ela destacou a convergência entre a política e segurança internacional. “Observa-se o esforço particular dos membros do Brics para a transição da ordem internacional, ainda em construção, mas que deverá estar baseada numa dinâmica multipolar. Esta adequação é o problema político da atualidade”, considerou.

Pensando a partir do fim da Guerra Fria, a professora identificou três momentos nesta transição da política internacional: na década de 1990, “o auge da paz liberal, com expectativa de multilateralismo”; em 2001, a investida unipolar liderada pelos Estados Unidos; e ainda “o pós-2005, onde a multipolaridade dá arrancada, do ponto de vista institucional, com a criação do Brics, por exemplo, como sinalização deste avanço”. “E o que vem de novo neste avanço é o esforço de configuração de uma visão de mundo alternativa e crítica ao esquema político ideológico do internacionalismo liberal”, avaliou.

Segundo Monica Hirst, é preciso que os países emergentes tenham maior influência nos novos desenhos de expansão. “No Conselho de Segurança da ONU, por exemplo, é preciso a ampliação da voz do poder de pressão destes países na configuração de uma nova ordem internacional”, defendeu. Ela citou o ano de 2011, quando todos os países membros do Brics sentaram ao mesmo tempo no Conselho de Segurança e “puderam trabalhar exprimindo e construindo decisões conjuntas”.

A professora considerou necessário pensar maneiras mais profundas de como aperfeiçoar a criação de outros órgãos dentro das Nações Unidas e debater questões que aproximem ainda mais estes países, “apesar das diferenças”. “São desafios importantes e difíceis, que devem ser aprofundados para a construção de uma posição crítica e alternativa ao internacionalismo liberal”.

Brics e a crise econômica

O senador Inácio Arruda (PCdoB-CE) falou sobre o Brics e a crise econômica mundial. Segundo ele, a crise “faz parte da natureza do sistema capitalista, mas que alcançou um grau de profundidade que não se via há décadas, comparada apenas à de 1929”. “A crise está no centro do sistema, mas que se expande com força e ainda não permitiu que as nações se recuperassem. Estados Unidos e países da Europa ainda patinam fortemente, amargando as maiores taxas de desemprego de suas histórias”, afirmou.

Já os países emergentes, segundo o senador, enfrentaram a crise de forma menos danosa. “Alguns apresentaram taxas de desemprego como as menores do mundo. China, Brasil, Índia, África do Sul e Rússia, no atual quadro de desenvolvimento econômico e social no mundo, estão enfrentam as dificuldades mostrando que existe grandes possibilidades de caminhar sem seguir o receituário imposto pelos americanos. O Brics representa esta capacidade de que um outro mundo é possível e que outros caminhos podem ser percorridos”, defendeu.

Inácio Arruda destacou o elo que une países tão distintos. “O sentimento de construção desses países tem muita importância. Histórias milenares como as da China, da Rússia e mesmo da Índia somam-se ao mais novo, o Brasil, que busca desenhar um projeto de desenvolvimento da nação”. Ainda sobre o Brasil, o senador considera sua posição geográfica outro ponto importante. “Estar no centro da América do Sul representa grande responsabilidade de desenvolvimento da região inteira”.

O parlamentar comunista destacou números relevantes quando o assunto é BRICS: “O bloco detém quase metade de população do mundo e quase metade do PIB produzido nos últimos 30 anos. Além disso, estas nações retiraram da linha de pobreza o maior número de pessoas, ocasionando impacto grande tanto na economia quanto no ponto de vista social”, enumerou.

Para Inácio, outro ponto convergente entre os países membros do Brics é o acerto quanto ao “enfrentamento da política hegemônica norte americana”. “O bloco tem o papel de encontrar um caminho alternativo, um novo movimento. E isto não é fácil, pois estes países precisam também consolidar a Paz. Cada crise que se abre, os falcões da guerra buscam se impor não pelo meio diplomático, mas pelo peso dos conflitos. O Brics joga grande papel no quadro político mundial e pode contribuir para um mundo de paz. Certamente estes países vão encontrar forte resistência do poder hegemônico, exigindo habilidade de unidade e manutenção dos interesses comuns”, defendeu.

Sistema financeiro internacional

José Fernandes de Sousa, doutorando em Direito Público da Universidad Nacional de Lomas Zamora, Argentina, abordou o Brics e o sistema financeiro internacional. Em sua intervenção, ele comparou seu tema com o “namoro que passou a ser a questão mais concreta da IV Cúpula”: a ideia de criar o banco e o fundo a fazer frente aos dois principais organismos internacionais (o FMI e Banco Mundial). “Esta etapa se concluindo, será grande a evolução para os países membros do bloco. A criação de mais um mecanismo de financiamento para o mundo inteiro, chamado Novo Banco de Desenvolvimento – NBD, não será restrito aos países que compõem o Brics, mas também aos outros países em desenvolvimento”, informou.

Fernandes apresentou dados que mostram a evolução do Brics desde sua criação até os dias atuais. Em 2003, o PIB dos países membros somava 9% do produzido no mundo. Hoje esse dado mais que triplicou, com 25%. Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul somam 42% da população do planeta e têm o maior poder de consumo do mundo, somando ainda 45% da força de trabalho mundial.

Para o doutorando em Direito Público, a confirmação da criação do NBD “pode se transformar num grande elemento da construção da nova era econômica mundial”. Segundo Fernandes, o banco terá capital inicial de 50 bilhões de dólares, com paridade de participação, e irá financiar projetos de infraestrutura de países emergentes. Já o fundo de contingência, poderá iniciar as atividades a partir de 2015, com capital na ordem de 11 bilhões de dólares, com o intuito de fazer frente ao FMI, financiar a estabilização econômica dos países do Brics e demais emergentes. “Aqui, já sem paridade de participação, a China entrará com 41 bilhões de dólares; Brasil, Rússia e Índia com 18 bilhões cada e ainda a África do Sul com 5 bilhões de dólares”. Ele defendeu ainda a criação de uma nova zona de comércio visando diminuir a dependência do dólar.

Ricardo Viana, representante da Fundação Leonel Brizola – Alberto Pasqualini levantou questões relativas à reforma da governança global. Ele destacou o lado diplomático para garantir a parceria governamental levando em conta as especificidades de cada país. “Além disso, esta parceria pode nos ensinar nas questões relativas ao social, com mais participação e democracia; no ponto de vista político, garantindo o envolvimento de novas gerações; e ainda a solidariedade entre os povos”.

A oficina continuou com o debate, quando a plenária pode participar, sugerir e analisar junto com os convidados a importância de eventos como a 6ª Cúpula do Brics em Fortaleza.

De Fortaleza,
Carolina Campos